Salsicha especial de fabricação própria; mussarela e molho de tomate fresco extremamente maduro e selecionado a dedo. Esses são os três ingredientes que dão vida ao sabor principal da pizzaria mais antiga do Brasil: castelhanosqual completa 100 anos no dia 1º de outubro no bairro do Brás, um dos redutos da comunidade italiana em São Paulo.
A pizza especial de calabresa, que leva o mesmo nome do estabelecimento, é a mais pedida do local há um século. Fundada por Vicente Donato, filho de imigrantes italianos, a cantina e pizzaria recebeu na época esse nome em homenagem a um clube de futebol da Série C do Campeonato Paulista de 1920: os castelhanos.
E se você tem a sensação de que já viu esse nome espalhado pelos cardápios das pizzarias da cidade, não se engana: é motivo de muitas homenagens e referências. A pizzaria Bráz, por exemplo, incorporou o sabor em seu cardápio e faz questão de destacar sua história centenária!
A história: pizza e futebol!
“Meu avô adorava futebol. Juntamente com colegas de trabalho e funcionários de uma indústria local, eles se reuniam todas as semanas para jogar bola. O local onde hoje trabalhamos servia de vestiário e também era o local onde aconteciam as confraternizações pós-jogo, sempre às segundas-feiras”, afirma. Fábio Donato, neto de Vicente e atual comandante do negócio.
Nessas reuniões, cada pessoa era responsável por trazer algo para comer. Teve gente que trouxe pão; outros carregavam queijo; alguns escolheram vinhos e assim por diante, até que Vicente, junto com Ettore Siniscalchi, seu amigo, um dos integrantes do grupo e com família de Nápoles, conhecida como a cidade da pizza, teve uma ideia: fazer um forno de pizza para o comemoração fica ainda melhor.
O primeiro forno não deu certo, mas o segundo, já grande para servir muita gente, ficou perfeito. O pedreirotão envolvido com o trabalho, tornou-se o primeiro pizzaiolo de Castelões
“O grupo foi crescendo cada vez mais e até os vizinhos passaram a fazer parte desse encontro, que ficou famoso no boca a boca. Todos comentaram o quão agradável foi esse encontro pós-jogo. Então, depois de construir o forno, meu avô, junto com o amigo, resolveram abrir um estabelecimento para continuar a festa de outra forma”, conta.
Os anos se passaram, a parceria prosperou e, em 1935, 11 anos depois, os sócios adquiriram a casa ao lado para ampliar o negócio. Porém, na década de 1950, Ettore fez uma viagem ao Rio de Janeiro para assistir à Copa do Mundo. Em poucos dias ele se apaixonou pela cidade e nunca mais quis sair. Resolveu então vender sua parte na pizzaria para o amigo e sócio, que passou a cuidar integralmente dos Castelões.
De geração em geração
Vicente dirigiu a pizzaria até 1987, quando faleceu. Ele passou o bastão para o filho João, que trabalhava com ele há mais de 20 anos e entendia não só como funcionava o restaurante, mas também os segredos das receitas.
Mantendo a tradição, contou também com a ajuda do filho, Fábio, que ingressou no negócio em 1988, aos 15 anos. E assim como havia acontecido anos antes, Fábio também assumiu a Castelões quando seu pai faleceu, em 2014.
No comando desde então, ele conta que suas lembranças de infância remontam diretamente à pizzaria. Ali estava o lugar onde ele brincava de esconde-esconde; o lugar que servia de cama quando estava cansado; onde guarda boas lembranças de brincar com o cozinheiro mais velho, entre outros momentos que carrega no coração.
“Passei minha infância inteira na pizzaria com meu pai. Começou a trabalhar às 5h, quando ia ao mercado. Depois, passava pela área de cereais e só então chegava à pizzaria, onde ficava até tarde. Desde pequeno eu dizia que queria ir à pizzaria”, lembra.
Mas foi só aos 15 anos, em 1988, que Fábio começou de fato a trabalhar no ramo. Apaixonado por carros, ganhou um de presente do pai – com a promessa de que só poderia usá-lo aos 18 anos. Em troca, teria que trabalhar aos domingos, dia agitado, ajudando no que fosse necessário. necessário. Aos poucos, o pai foi passando as responsabilidades administrativas, até que Fábio ficou à frente de todos os processos. Quer dizer, quase todo mundo!
Ele se lembra de uma situação engraçada em que teve que cuidar da pizzaria enquanto seu pai estava viajando.
“Eu costumava fazer compras com ele. Já sabia selecionar fornecedores, mas cometi muitos erros que me ensinaram muito, principalmente relacionados às quantidades. Todos os nossos tamanhos eram enormes. Comprei 1 tonelada de farinha, 40kg de tomate, berinjela, até que um dia precisei comprar orégano. O fornecedor me perguntou quanto eu precisava… Ele disse que tinha 10 sacos de papel de 8kg cada e eu aceitei. Resultado: sai com 80kg de orégano. Fiquei anos sem comprar nada e tendo que administrar essa quantidade em local adequado”, lembra, rindo.
Evolução constante da receita
Para Fábio, o termo fermentação naturalque vem ganhando cada vez mais espaço na panificação, já é bastante conhecido. Suas receitas sempre tiveram um período mínimo de fermentação de 24 horas, além de acompanhar à risca todo o processo de produção, que ele aprendeu através de muito estudo e muitas viagens à Itália.
“Embora a base seja a mesma de 100 anos atrás, os ingredientes estão cada vez melhores. Antes a pizza era feita com farinha nacional. Hoje o nosso vem do Parma e tenho constância para trabalhar com ele da melhor forma. Testo todas as possibilidades até a exaustão. A massa precisa ser leve, saborosa e digestiva. A pizza nunca mais será a mesma, sempre será melhor. Eu estudo muito e isso está mudando constantemente“, exalta Fábio, que tem a sócia Cláudia Pino como comandante da produção de massas.
Recentemente, o casal adquiriu uma amassadeira italiana que consideram “seus sonhos”, o que, para eles, contribuirá muito para a evolução do que é servido no local, o que classifica o compromisso com a qualidade como um dos motivos da fidelização dos seus clientes. clientes.
“Do vendedor de jornais ao dono do jornal”
É assim que Fábio descreve seu público. O local já hospedou inúmeras personalidades da televisão, da música, da política e do futebol, como Hebe Camargo, Luiz Gonzaga e o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, por exemplo. Mas para ele a fama é apenas consequência de muito trabalho em valorizar cada detalhe pela confiança de todos os seus clientes – que ele garante: vêm de todos os perfis.
“Minha maior lição nesses 100 anos de história é ter compromisso e honrar a confiança de nossos clientes, fazendo sempre o melhor que podemos. Antes de definir o preço, você precisa acertar. Com isso, o seu sucesso é consequência. Você precisa ser extremamente correto com o que faz. Nunca vimos isso como fama. Quando foi noticiado na mídia que Fernando Henrique veio comemorar sua vitória aqui, ninguém sabia que ele já era cliente há mais de 30 anos. Conquistamos respeito e confiança ao longo do tempo”, destaca.
E se há algo que a Castelões conseguiu foi certamente a sua fidelidade de clientes. Fábio lembra de alguém que vai religiosamente toda semana, senta na mesma mesa, no mesmo horário e faz o mesmo pedido. Tem gente que atravessa a cidade para escolher entre 18 sabores disponíveis – mas acabam sempre optando pelos tradicionais. E ainda há quem venha há décadas, desde que o avô dirigia o local.
É o caso de Henrique Marin Munhoz, que frequenta pizzaria desde os 5 anos. Foi lá que ele comemorou a formatura da faculdade, recebendo de presente as pizzas de comemoração de Vicente. Hoje, aos 82 anos, Henrique continua levando a família ao seu lugar preferido, que traz tantas lembranças.
“Meu pai me levou e ano após ano continuei frequentando. Primeiro levei Olavo, meu amigo de faculdade, para conhecê-lo. Aí, levei minha namorada quando ela se tornou minha esposa. Nos Castelões mantém-se a forma tradicional de preparar uma pizza, tal como em Itália. O restaurante é acolhedor, conheço todo mundo lá e vou pelo menos uma vez por mês, sempre levando alguém junto”, conta Henrique, que, além de ir com a família, ainda passa no caminho para buscar o amigo Olavo.
Comemorando 100 anos
Com toalhas xadrez verdes e vermelhas, bem típicas das cantinas italianas, Castelões serve por aí 90 pessoas por noite. Durante a pandemia, ele se rendeu aos aplicativos de delivery e estuda desenvolver seu próprio delivery.
A casa está em processo de restauração. A ideia é que ele volte a ser exatamente como era, fazendo com que o cliente viaje diretamente para a época de sua fundação, com itens e decoração semelhantes, como geladeiras de madeira.
O forno centenário permanece intacto. De lá saem 18 sabores, sendo os mais vendidos os tradicionais: Castelões, calabresa, mussarela, margherita, portuguesa, napolitana e quatro queijos.
Quando questionado sobre como vê a casa no futuro, Donato é rápido: sempre comprometido em levar o melhor aos nossos clientes. Que venham mais 100 anos!
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