Um filhote de baleia jubarte Tornou-se uma história de sucesso científico depois de especialistas contradizerem o procedimento padrão de eutanásia para cetáceos encalhados e devolverem-no ao mar – e à sua mãe. Isso porque o projeto Amigos da Jubarte, da ONG O Canal, identificou o animal nadando com a mãe dias após o resgate na Praia de Manguinhos, no Espírito Santo — caso raríssimo de cetáceos, que costumam aparecer mortos após serem encontrados na orla.
Thiago Ferrarium dos fundadores da ONG, disse CNNque foram chamados para realizar um encalhe na praia em 2023. Foi o segundo dia consecutivo de encalhe do filhote de baleia, que ainda teve seu o cordão umbilical.
No primeiro dia voltou ao mar com a ajuda de banhistas mas na manhã do dia seguinte o mesmo bezerro encalhou novamente, desta vez entre rochas e corais — um local muito complicado de resgatar — e ficou gravemente ferido.
Devido às dificuldades do resgate, que durou mais de seis horas, especialistas discutiam a possibilidade de sacrificar o cachorrinho, que sofria com os ferimentos, mas gozava de boa saúde.
José Marcelodiretor de Instituto Orcaque monitora praias do litoral capixaba, arriscou tudo indo contra o protocolo de eutanásia do cachorrinho.
Segundo ele, as instituições responsáveis quiseram fazer isso porque ficaram impressionadas com os ferimentos e angustiadas com o sofrimento do animal. A eutanásia, para eles, parecia a melhor solução.
O veterinário Ian Augusto Gusman Cunha, único profissional da área presente no local, tambémoi contra a medida.
Ele avaliou que o animal estava bem de saúde e notou que melhorou quando uma baleia adulta, próxima à borda, mexeu a nadadeira, aparentemente chamando pelo filhote.
O cetáceo adulto chegou a seguir barcos para verificar se era sua prole, segundo Thiago Ferrari.
O diretor do Instituto Orca disse CNN que, após a mãe chamar seu bebê, o bebê respondeu com vocalizações e pareceu ganhar ainda mais força — outro fator fundamental para insistir em seu resgate e reencontro com a mãe. “Foi pela relação entre mãe e filho que queríamos salvar ainda mais esse filhote”, disse ela.
Com a maré subindo, as equipes de resgate conseguiram libertar o bebê, e o animal não encalhou novamente.
O resultado mostrou que a análise dos especialistas — de que o cachorrinho estava de boa saúde — estava correta. Posteriormente, com análises laboratoriais do sangue do bezerro, as equipes comprovaram que o estado de saúde do cetáceo estava em excelentes condições. A teoria, então, era que o filhote havia chegado às águas rasas para brincar nas águas mais quentes da costa.
Thiago Ferrari disse que todos os envolvidos no resgate foram criticados por não realizarem a eutanásia. Mas, ao encontrarem o filhote nadando com a mãe dias depois, a decisão “provou ser a correta ao acreditar que o filhote poderia sobreviver”, disse ele. CNN.
O Instituto Orca e o projeto Amigos da Jubarte receberam reconhecimento da Câmara Municipal da Serra, no Espírito Santo, pelo trabalho realizado no resgate do bezerro macho.
Reconhecimento de filhotes
No dia do resgate, o cachorrinho ganhou uma cicatriz em forma de meia-lua perdendo parte de sua barbatana caudal.
A marca foi essencial para sua identificação, encontrado nadando com a mãe cerca de dois ou três dias depois de encalhar (e desencadear).
A equipe reconheceu o filhote pelo seu monitoramento de drones – método de pesquisa desenvolvido pelo projeto que consiste em aeronaves não tripuladas que captam imagens em alta definição para avaliar, em laboratório, padrões comportamentais, composição social e saúde dos indivíduos.
Amigos da Jubarte analisou essas imagens com o pesquisador Sâmia Alpoimque reconheceu o formato de meia-lua da cauda do filhote.
A situação realça o sucesso do encalhamento, uma vez que os bebés tendem a perder a mãe quando ficam encalhados e, portanto, não conseguem sobreviver.
Outra forma de identificar o bebê foi observando a forma como ele nada — que não acompanhava a mãe, como costuma acontecer, com o rabo para cima e para baixo, mas jogando o rabo um pouco para o lado, como um tubarão.
“Conseguimos, de alguns ângulos, observar alguns detalhes e algumas cicatrizes e vimos que era o mesmo animal”, disse o pesquisador. CNN.
“Até agora não vimos nenhum animal nestas condições no mar logo após o encalhe. […] Geralmente, alguns dias após o encalhe, vemos o animal encalhado novamente, levando ao óbito. Ainda não tínhamos essa história de sucesso. Foi o primeiro caso que conseguimos identificar“, ele adicionou.
Sâmia acredita que o animal ainda hoje está vivo, afinal, se não estivesse, provavelmente já teria sido encontrado encalhado em alguma praia. Ao se reunir com sua mãe após ser libertado, as chances de sobrevivência do filhote aumentam significativamente.
“Apesar do movimento caudal ligeiramente diferente, ele estava em uma situação velocidade considerada normal e não vimos nenhuma indicação de que ela pudesse chegar em condições de encalhar novamente. Consideramos que foi um revezamento bem-sucedido e que provavelmente ele seguirá em frente com sua vida.”
Os outros pesquisadores também argumentam que a baleia ainda está viva — e esperam encontrá-la novamente. Os bebês jubarte podem acompanhar as mães por três temporadas (cerca de três anos) até atingirem a independência completa.
Para Ferrari, o reencontro desse animal também comprova que o método científico de análise de imagens do drone de monitoramento é confiável.
Mudança no protocolo de eutanásia
Houve uma mudança no protocolo de resgate, da Rede Nordeste de Remoção de Mamíferos (Remane), de 2005, que não deixou totalmente claro quem deveria tomar a decisão da eutanásia. A edição do ICMBio, lançado em janeiro deste anoapós libertar o bezerro jubarte, deixa claro que quem deve decidir pela realização ou não do procedimento é o veterinário e a equipe de campo.
A mudança na guia, porém, não aconteceu apenas por causa do caso isolado do cachorrinho. “Realizar a eutanásia pela legislação brasileira é de responsabilidade exclusiva do veterinário após ele avaliar o animal e constatar que ele não tem capacidade de sobrevivência”, explicou. Milton César MarcondesO CNNum dos organizadores do guia atualizado.
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