Este ano o Brasil registrou mais de 7 mil casos confirmados de febre oropoucheincluindo três mortes, segundo o Ministério da Saúde. As mortes foram as primeiras confirmadas no mundo. A doença é causada por um arbovírus — ou seja, um vírus transmitido por um mosquito — e apresenta sintomas semelhantes aos da dengue, mas ainda há pouco conhecimento científico sobre o assunto.
A febre Oropouche é causada pelo vírus Orthobunyavírus oropoucheense (Orov), isolado pela primeira vez em 1960. Desde então, casos isolados e surtos têm sido relatados no Brasil, principalmente nos estados da região amazônica. Além dos humanos, animais selvagens como macacos e aves podem ser infectados pelo vírus. O contágio para humanos ocorre principalmente através de picadas de mosquitos Culicoides paraensisconhecido como maruim ou flebotomíneo.
Entre os principais sintomas da febre oropouche estão febre de início súbito, dor de cabeça, dores musculares e dores nas articulações. Os idosos e as crianças imunocomprometidas correm maior risco de complicações da doença.
“No entanto, já confirmamos duas mortes em jovens saudáveis, de 30 anos, devido à febre oropouche. Então, ainda temos muito desconhecimento sobre o que está acontecendo”, diz Raquel Stucchi, infectologista, professora da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e consultora da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), ao CNN.
O que ainda precisamos saber sobre a febre oropouche?
Embora o vírus causador da febre oropouche tenha sido isolado pela primeira vez em 1960, ainda há pouco conhecimento sobre a gravidade dos sintomas da doença, a forma como ela pode atuar no organismo e sua virulência (capacidade de um vírus ou bactéria se multiplicar em um organismo), segundo Alexandre Piva, infectologista e professor de medicina da Universidade Cidade de S. Paulo (Unicid).
“Várias pesquisas estão em andamento”, diz o especialista ao CNN. “[Existe] a busca pelo melhor entendimento da quantidade de animais que podem servir como reservatórios do vírus e identificação de todos os vetores (mosquitos) responsáveis pela transmissão. É preciso também entender a resposta imunológica ao vírus, como ele causa a doença e até entender a possibilidade de complicações como meningite e encefalite”, completa.
Outro ponto que ainda precisa ser estudado e testado é o desenvolvimento de testes diagnósticos rápidos e sorológicos para detectar a doença, além de ferramentas que ajudem a diferenciar a febre oropouche de outras doenças transmitidas por mosquitos, como dengue, chikungunya, zika e malária. .
Um estudo, publicado na revista científica Zoonoses no primeiro, elenca o que já se sabe sobre o oropouche e o que resta saber. O artigo cita a falta de resultados consistentes entre a presença do vetor e os surtos em relatórios recentes, a má compreensão dos reservatórios naturais que aumentam o risco de transmissão, a compreensão incompleta dos fatores patogênicos do vírus ligados à doença em humanos e a suscetibilidade a sintomas hemorrágicos, como acontece na dengue.
Além disso, o estudo acrescenta que a caracterização de certas estirpes virais em modelos animais e a utilização destas estirpes na procura de identificar factores do hospedeiro afectado e potenciais tratamentos “está a desenvolver-se lentamente”.
O que poderia estar associado ao surto atual?
Esta também é uma questão a ser respondida. O artigo publicado na Zoonoses mostrou que os recentes relatos de surtos em países latino-americanos e a recente detecção da doença em Cuba “são indicadores claros da expansão geográfica desta doença tropical negligenciada”.
“Essa era uma doença muito restrita à Amazônia e não costumava ocorrer com quadros graves. Mas o surto atual está acontecendo, até agora, fora da região amazônica, o que nos mostra que alguma mudança deve ter acontecido, principalmente em relação à capacidade do vírus de causar uma doença mais grave ou à sua capacidade de transmissão”, afirma Stucchi.
Um estudo recente, realizado por pesquisadores do Instituto de Biologia da Unicamp (IB), em parceria com a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e a Universidade Federal do Amazonas, além de outras instituições internacionais, mostrou que houve um aumento de quase 200 vezes na incidência de febre oropouche em comparação com os casos relatados na última década.
O trabalho estudou uma nova variante do vírus responsável pela febre oropouche — chamada de “novo oropouche” — e mostrou, em dados preliminares, que ela é capaz de se replicar até 100 vezes mais que a variante original, além de ter maior capacidade de replicação. a resposta imunológica do corpo.
A mesma investigação sugere ainda que a propagação do vírus foi impulsionada por movimentos de curta distância de mosquitos infectados (menos de 2 km), mas que houve uma proporção significativa de migrações de longa distância (mais de 10 km), o que indica que atividades Os humanos contribuíram para a dispersão. O estudo foi publicado em versão pré-impressa e ainda precisa ser revisado por pares.
“Isso ainda não está comprovado, mas pode ser confirmado, pois, com mais vírus, a capacidade de transmissão é maior. E essas alterações no genoma do vírus podem até ser responsáveis por uma maior gravidade da doença, incluindo a transmissão da mãe para o bebê”, destaca Stucchi.
No dia 2, o Ministério da Saúde confirmou que uma das mortes decorrentes da febre oropouche foi fetal. Outros casos estão em investigação e a secretaria emitiu alerta, no dia 18 de junho, para reforçar a notificação de casos de malformações fetais que possam estar ligadas à infecção por oropouche.
“Tudo isso ainda é fonte de investigação, ainda não sabemos do que esse vírus é capaz neste momento”, reforça.
Ainda não existe tratamento específico para a febre oropouche.
Outra lacuna em relação à febre oropouche é a falta de tratamento específico, ou seja, antivirais capazes de agir contra a ação do vírus Orov. “O tratamento recomendado visa aliviar os sintomas e inclui repouso, hidratação vigorosa, uso de antitérmicos em caso de febre, dipirona em caso de dor. Tudo sob acompanhamento médico”, explica Paiva.
Como ainda não se sabe se o vírus pode causar sintomas hemorrágicos, como a dengue, não é recomendado o uso de medicamentos como ibuprofeno, ácido acetilsalicílico, diclofenaco, salicilato de sódio, metilsalicilato e corticoides, que podem facilitar o sangramento.
Na ausência de vacinas, a prevenção é feita minimizando a exposição aos mosquitos
Ainda não existe vacina contra a febre oropouche. Portanto, a prevenção de doenças é realizada por meio das seguintes medidas, segundo o Ministério da Saúde:
- Se possível, evite áreas onde haja muitos mosquitos;
- Use roupas que cubram a maior parte do corpo;
- Use repelentes de mosquitos nas áreas expostas da pele;
- Remover possíveis criadouros do mosquito, como água parada em pneus, calhas e vasos de plantas, além de manter piscinas e caixas d’água limpas e tampadas.
O Ministério da Saúde afirma que — caso haja casos confirmados na sua região — você deve seguir as orientações das autoridades sanitárias locais para reduzir o risco de transmissão.
Em caso de sintomas suspeitos de febre, a instituição recomenda procurar atendimento médico imediato.
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