Um novo medicamento injetável para prevenção do HIV mostrou 100% eficaz em mulheres cisgênero, de acordo com um grande ensaio clínico realizado na África do Sul e em Uganda. A injeção, administrada a cada seis meses, demonstrou maior proteção contra infecções em comparação com outros dois medicamentos de profilaxia pré-exposição (PrEP).
A eficácia e segurança do medicamento, denominado lenacapavirforam testados no ensaio clínico PURPOSE 1, realizado em três locais em Uganda e 25 locais na África do Sul. O estudo avaliou a eficácia da nova PrEP e de outros dois medicamentos já utilizados para prevenir a infecção pelo HIV, ambos comprimidos diários.
O lenacapavir é um inibidor da fusão do capsídeo, o que significa que interfere no capsídeo do HIV, uma camada proteica que protege o material genético do vírus e as enzimas necessárias para a replicação. Seu uso é injetável, sob a pele, sendo necessária aplicação apenas duas vezes ao ano — uma vez a cada seis meses.
“Com zero infecções e 100% de eficácia, o lenacapavir semestral demonstrou o seu potencial como uma nova ferramenta importante para ajudar a prevenir infecções pelo VIH”, disse Merdad Parsey, diretor médico da Gilead Sciences, que desenvolveu o medicamento, num comunicado. “Esperamos resultados adicionais do programa clínico PURPOSE em curso e continuamos em direção ao nosso objetivo de ajudar a acabar com a epidemia do VIH para todos, em todos os lugares.”
Como foi realizado o estudo?
O ensaio clínico testou se a injeção bianual de lenacapavir era segura e proporcionaria melhor proteção contra o VIH como PrEP em comparação com Truvada F/TDF, uma pílula diária que tem sido amplamente utilizada há mais de uma década como PrEP.
Em segundo lugar, o estudo também testou se o Descovy F/TAF, um comprimido diário semelhante ao Truvada, mas mais recente e com propriedades farmacocinéticas superiores, era menos ou mais eficaz do que a injeção bianual de lenacapavir.
Para isso, mulheres entre 16 e 25 anos foram aleatoriamente designadas para receber um de três medicamentos: lenacapavir, Truvada ou Descovy. O estudo foi realizado de forma duplo-cega, ou seja, nem os participantes nem os pesquisadores sabiam qual tratamento as mulheres estavam recebendo até o término do ensaio clínico.
De acordo com o estudo, nenhuma das 2.134 mulheres que receberam lenacapavir contraiu HIV. Ou seja, o medicamento foi 100% eficiente na prevenção da infecção. Em comparação, 16 das 1.068 mulheres que tomaram Truvada (1,5%) e 39 das 2.136 que receberam Descovy (1,8%) contraíram o vírus.
Novo medicamento pode aumentar adesão à PrEP, afirma pesquisadora
“O lenacapavir bianual para a PrEP, se aprovado, poderá constituir uma nova opção crítica para a prevenção do VIH que se enquadra na vida de muitas pessoas que poderiam beneficiar da PrEP em todo o mundo – especialmente mulheres cisgénero”, afirma Linda-Gail Bekker, diretora do Desmond. Centro Tutu HIV da Universidade da Cidade do Cabo, África do Sul, e ex-presidente da Sociedade Internacional de AIDS, em comunicado.
“Embora saibamos que as opções tradicionais de prevenção do VIH são altamente eficazes quando tomadas conforme prescrito, o lenacapavir bianual para PrEP pode ajudar a resolver o estigma e a discriminação que algumas pessoas podem enfrentar ao tomar ou armazenar comprimidos orais de PrEP, bem como potencialmente ajudar a aumentar a adesão e persistência da PrEP. A PrEP, dado seu cronograma de dosagem semestral”, avalia.
No ano passado, registaram-se 1,3 milhões de novas infecções por VIH em todo o mundo, de acordo com o Programa Conjunto das Nações Unidas sobre o VIH/SIDA (ONUSIDA). A taxa está acima da meta de redução do número de novas infecções pelo HIV para 500 mil casos globais até 2025, estabelecida pela entidade.
A PrEP não é a única forma de combater a SIDA: faz parte de um conjunto de métodos preventivos, incluindo o acesso e uso de preservativos, tratamentos para infecções sexualmente transmissíveis (IST) e autoteste de VIH.
Os próximos passos incluem ensaios clínicos em homens
Os estudos clínicos do Objetivo 1 serão continuados, mas agora em fase “aberta”. Ou seja, os participantes do estudo serão informados se fizeram parte do grupo que recebeu a medicação injetável ou as demais opções orais. Eles poderão escolher e preferir a PrEP à medida que o estudo avança.
Outro passo importante é o estudo Finalidade 2, que está em andamento e cujos resultados deverão ser divulgados no final deste ano ou início de 2025. O trabalho avalia o lenacapavir semestral para PrEP entre homens cisgêneros que fazem sexo com homens, homens trans, mulheres trans e não -pessoas binárias que fazem sexo com parceiros masculinos (atribuídas no nascimento).
O estudo Finalidade 2 está em andamento no Brasil, além de Argentina, México, Peru, África do Sul, Tailândia e Estados Unidos.
Se os resultados de ambos os estudos forem positivos, serão incluídos no processo regulamentar para a utilização do lenacapavir como PreEP, para garantir que o medicamento seja aprovado para diversas populações e comunidades que necessitam de opções adicionais de prevenção do VIH.
Os resultados deverão ser analisados pelos órgãos reguladores de cada país. A Organização Mundial da Saúde (OMS) também analisará os dados e poderá emitir recomendações, potencialmente adotando o medicamento nas suas diretrizes de prevenção do HIV.
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