Ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) defendem a adoção de métodos de negociação e conciliação para disputas que envolvam conflitos por terras no campo entre agricultores e povos indígenas.
Os discursos de apoio ao formato da resolução foram feitos por Gilmar Mendes, Alexandre de Moraes, Flávio Dino e Luís Roberto Barroso na abertura do plenário desta quinta-feira (26).
Na noite anterior, o STF chegou a um acordo de conciliação para resolver o conflito fundiário envolvendo a demarcação da Terra Indígena Ñande Ru Marangatu, no Mato Grosso do Sul.
O processo foi conduzido pelo gabinete do ministro Gilmar Mendes. A disputa ocorre desde 2005. Nas últimas semanas, houve uma escalada de violência com ataques a tiros. Pelo menos dois indígenas foram mortos.
Para Gilmar, o modelo adotado para resolver o caso foi “extremamente relevante”. “Talvez seja um aprendizado institucional para modelar outras áreas conflitantes ou conflitantes que temos”, disse ele.
O ministro disse que foi feito um “trabalho hercúleo” para chegar à conciliação e que houve “trabalho construtivo” por parte do governo federal.
“[Houve um trabalho construtivo do governo] a partir de orientações do próprio presidente da República, Lula, que, ainda nesse intervalo, em Nova York, participou, se conectou e se engajou diretamente nesse processo”.
“Acordo histórico”
Alexandre de Moraes elogiou a iniciativa de Gilmar em viabilizar o acordo e disse que o passo dado foi “histórico”.
“A questão indígena é extremamente delicada”, afirmou. “Se não houver consenso, acordo, principalmente Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, onde há várias terras que foram devolvidas lá por Dom Pedro, se não houver indenização, se não houver ideia de solução para todos lados, realmente ficaremos décadas com esse problema.”
Segundo Moraes, a experiência do acordo celebrado permitirá aos indígenas e agricultores perceberem que “é possível sentar à mesa e chegar a um acordo para o bem de todos e do país”.
Flávio Dino e o presidente do Tribunal, Luís Roberto Barroso, seguiram a mesma linha.
O primeiro chamou o acordo sobre terras indígenas de “conquista”.
“Essa conquista mostra, além das virtudes em si, talvez um modelo de sucesso em que a conciliação faz parte do rol de soluções possíveis em termos de direitos fundamentais e temos esse exercício dialético de construção de um bom relacionamento com as partes e com a sociedade . saída”, declarou.
O presidente do STF elogiou a iniciativa de Gilmar e defendeu a possibilidade de resolução de conflitos por meio do diálogo.
“Há uma percepção um tanto equivocada de que direito e litígio são a mesma coisa. E uma percepção crítica da atuação do Judiciário para evitar litígios ou resolver conflitos”, afirmou. “E nosso papel é resolver problemas, não necessariamente decidir disputas.”
Prazo
Segundo Gilmar, o acordo sobre o território Ñande Ru Marangatu traz pontos do entendimento do STF em relação ao prazo para demarcação das terras indígenas.
No caso do território em questão, os agricultores que estiverem na área (que já foi decretada como posse indígena permanente) receberão R$ 130 milhões da União como compensação pelo valor da própria terra e pelas benfeitorias feitas no local .
O estado de Mato Grosso do Sul também pagará aos proprietários mais R$ 16 milhões.
A possibilidade de compensação pelo valor do terreno, denominado “terreno descoberto”, foi um dos pontos apontados pelo STF na tese em que declarou inconstitucional o marco temporal, em setembro de 2023.
Mesmo com a decisão da Corte, o prazo virou lei por decisão do Congresso. A tese que estabelece que os indígenas só têm direito às terras que ocuparam ou disputaram no dia da promulgação da Constituição (5 de outubro de 1988) está em vigor desde dezembro.
Desacordo
Apesar dos discursos públicos em defesa do modelo, não há acordo total entre as comunidades indígenas sobre as condições em que as negociações são realizadas.
No final de agosto, por exemplo, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) retirou-se de câmara de conciliação criada no STF para discutir ações contra a lei do marco temporal
Na altura, um dos principais factores citados pela entidade foi o facto de esta lei ter continuado a vigorar durante o período de negociações – uma situação de “desigualdade negocial”.
Segundo a entidade, não havia garantias de proteção suficiente aos povos indígenas e de um possível acordo que protegesse a autonomia dos povos originários.
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