Após um ano de seca recorde na Amazônia em 2023 e uma estação chuvosa fraca, os rios da região vêm diminuindo rapidamente desde junho, trazendo ameaças de uma nova seca desastrosa este ano. As previsões do Serviço Geológico Brasileiro (SGB) para este ano indicam que todos os rios da Bacia Amazônica têm grande probabilidade de permanecerem abaixo de seus mínimos históricos.
A combinação de altas temperaturas, precipitações abaixo da média histórica, após um ano extremamente seco, traz as previsões mais pessimistas para a região. “Os rios nunca recuperaram da seca do ano passado, o período chuvoso deste ano não foi forte, não compensou a seca de 2023 e as altas temperaturas deste ano agravam a situação. Os rios já estão mais secos do que nesta época do ano passado”, afirma o climatologista José Marengo, coordenador de Pesquisa e Desenvolvimento do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden).
A pesquisadora explica que eram esperadas mais chuvas no segundo semestre deste ano com a chegada do fenômeno La Niña, com o resfriamento acima do normal das águas do Oceano Pacífico ao nível da Linha do Equador. Isto geralmente traz mais chuva para o Norte e seca para o Sul. Porém, diz Marengo, as águas do Pacífico ainda não esfriaram como esperado, o suficiente para causar um La Niña, que, somado à falta de chuvas em 2023, traz uma situação catastrófica para a Amazônia. “Em secas normais, os rios têm volume suficiente para transportar alimentos e pequenas embarcações. Mas não agora. Secou e as pessoas ficaram isoladas”, afirma.
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Criador do conceito de “rios voadores”, que transportam a umidade do período chuvoso da Amazônia para o restante do país, principalmente o Cerrado e o Pantanal, o cientista explica que, se quando chegar novembro não houver umidade suficiente, os rios voadores os rios não terão o que levar para o Cerrado e Pantanal, agravando a situação de seca nessas regiões. Marengo lembra que até a Região Sudeste é afetada, já que a maior parte dos rios que abastecem a região da Cantareira, em São Paulo, nasce no Cerrado.
Em geral, a maior parte das bacias da região amazônica apresenta taxas inferiores ou próximas às do ano passado. No rio Solimões, por exemplo, na região de Tabatinga (AM), na divisa com Peru e Colômbia, a previsão é de 65% de chance de as águas atingirem o mínimo histórico de 2010. O rio Negro, que banha Manaus, que atingiu seu nível mais baixo em 2023, tem 16% de chance de cair ainda mais este ano. Purus tem 34% de chance de ficar abaixo dos quatro metros registrados no ano passado.
Em toda a região, de acordo com os boletins do SGB, os rios têm caído rapidamente nas últimas semanas e os efeitos das secas já começam a ser sentidos nas comunidades ribeirinhas e nos transportes da região. As bacias dos rios Solimões, Madeira e Purus estão abaixo das expectativas para a temporada.
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No dia 29, segundo dados de medição da Marinha, o rio Solimões, em Tabatinga, tinha apenas 78 centímetros de altura. Em Porto Velho, o rio Madeira está abaixo de dois metros desde julho e no dia 28 atingiu 1,95 metros. O rio, que conta com duas hidrelétricas, Jirau e Santo Antônio, ainda é uma das principais hidrovias da Região Norte e o transporte já está comprometido. Em agosto, segundo o SGB, a cota normal do rio é de 5,3 metros.
Segundo o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT), o governo já iniciou obras de dragagem na Madeira, em pontos considerados críticos. No entanto, o transporte na região já está comprometido, apenas embarcações de baixo calado conseguem passar. Nos rios Amazonas e Solimões, informa o DNIT, ainda estão sendo contratadas obras de dragagem.
Em Manaus, o rio Negro tem 21 metros de profundidade, ante 24 metros na mesma época de 2023, e começa a preocupar os empresários da região. Em junho, a associação dos produtores de eletroeletrônicos da Zona Franca solicitou obras de dragagem do rio por temer que a seca prejudicasse o transporte dos produtos, como em 2023.
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Análise da consultoria Argus mostra que o impacto no transporte hidroviário neste ano pode ser ainda maior do que em 2023. No ano passado, mostra a consultoria, a seca já impediu a movimentação de barcaças nos portos do Amazonas, e este ano a previsão é um período de seca ainda pior. “Essa situação deve levar a um redirecionamento de cargas de grãos e fertilizantes nos próximos meses, fazendo com que sejam desviados para Itaqui e outros portos do Sul e Sudeste do Brasil”, diz análise da consultoria. Essa mudança provavelmente levará ao aumento dos custos de envio para os produtores.
Isolamento
Em toda a região, comunidades inteiras já estão isoladas devido à falta de navegabilidade dos rios. Rios excessivamente baixos, além de prejudicarem as lavouras e a pesca, dificultam a circulação dos moradores para aquisição de alimentos. O governo do Amazonas já declarou emergência de seca em 62 municípios do estado e 77,5 mil famílias já foram afetadas pela falta de água e alimentos.
Em Rondônia, os principais rios do estado estão em níveis semelhantes ou inferiores ao mesmo período do ano passado, indicando uma seca pelo menos tão severa quanto a de 2023. Segundo a Defesa Civil do estado, diversas regiões de riachos secaram, levando à mortalidade de peixes e danos às comunidades ribeirinhas que vivem da pesca.
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