O Supremo Tribunal Federal (STF) deverá julgar nesta quarta-feira (14) uma ação que questiona as regras para investigação de acidentes aéreos.
O processo questiona a limitação do uso de dados de investigação de acidentes como prova em juízo. Desafia também as restrições estabelecidas por lei para o acesso da polícia e do Ministério Público aos destroços das aeronaves.
O caso é o primeiro item da pauta do plenário desta quarta-feira (14). Ele foi levado a julgamento nesta sexta-feira (9), após a queda do avião Voepass em Vinhedo (SP), que matou 62 pessoas.
Entre os pontos a serem discutidos estão:
- acesso a dados e confidencialidade das investigações de acidentes aéreos;
- utilização de informações como prova em processos judiciais ou administrativos;
- limites para a atuação da polícia e do Ministério Público na investigação de acidentes;
- subordinação da polícia e do Ministério Público ao Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa) para análise de destroços de aeronaves.
A ação foi apresentada pelo então procurador-geral da República Rodrigo Janot, em 2017.
O processo questiona trechos do Código Brasileiro de Aeronáutica que foram alterados por uma lei de 2014.
A norma alterou regras sobre investigações do Sistema de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Sipaer) e acesso aos destroços de aeronaves acidentadas. A Sipaer está sob responsabilidade do Cenipa.
A ação começou a ser julgada em agosto de 2021 no plenário virtual do Tribunal. O relator, ministro Nunes Marques, votou pela validação dos trechos questionados.
Alexandre de Moraes fez pedido de reexame (mais tempo para análise), e o caso está paralisado desde então.
Direito de defesa
De acordo com a ação da PGR, os trechos questionados da lei violam diversos direitos, como o da ampla defesa, além de restringirem indevidamente as funções dos órgãos da Justiça.
Para Janot, ao determinar que as conclusões da investigação, via de regra, não servirão como prova em processos judiciais, a lei proíbe que órgãos e pessoas acessem informações que sejam de seu “legítimo interesse”, como o Ministério Público e a polícia criminal, bem como as vítimas e suas famílias.
“São dados que dizem respeito às pessoas afetadas por acidentes e incidentes aéreos, aos seus familiares e às funções institucionais destes órgãos. A vedação legal de acesso suprime o direito de defesa garantido constitucionalmente”, afirmou na ação.
Outro ponto questionável é o que vincula o acesso às análises e conclusões do Sipaer à decisão judicial.
Pela lei, dados de voo, gravações de conversas entre órgãos de controle de tráfego, conversas na cabine da aeronave e os próprios registros das atividades da Sipaer só poderão ser utilizados como prova, em casos específicos, após decisão judicial, ouvido o parecer do Cenipa. .
Ação da Justiça
Para a PGR, esta norma provoca “restrição à defesa dos envolvidos e viola os atributos de razoabilidade e proporcionalidade”, ao impor obstáculos à atuação do Poder Judiciário.
Segundo o Código Brasileiro de Aeronáutica, a investigação de acidentes aéreos tem como “único objetivo” a “prevenção de outros acidentes e incidentes”.
Na ação, a PGR argumenta que eventuais responsabilidades das companhias aéreas e dos fabricantes podem ser prejudicadas pela forma como são feitas as investigações dos acidentes.
“Em investigações administrativas aeronáuticas, não é incomum que equipamentos de aeronaves danificadas sejam enviados aos próprios fabricantes para análise. Isso é perfeitamente compatível com os propósitos e princípios desta investigação, que busca prevenir acidentes e incidentes, mas não é, em princípio, com a busca da verdade no processo cível e, principalmente, no processo penal”, afirmou.
“Falhas nesses produtos podem gerar responsabilidade civil e até criminal aos fabricantes e seus prepostos, não podendo ser admitidos que interessados em se esquivar de tais responsabilidades realizem tais exames sem o devido acompanhamento de especialistas da Justiça.”
“Isto pode afetar de forma decisiva o exercício da jurisdição, ao impedir que o Poder Judiciário disponha de provas fiáveis e preservadas com base nas quais possa aplicar a lei”, concluiu a PGR.
Destroços
Outra seção da lei restringe o acesso da polícia e do Ministério Público ao local dos destroços do avião. Nestes casos, é necessária autorização do Cenipa para exame dos restos mortais.
“Interpretadas estritamente, as normas do Código Brasileiro de Aeronáutica criam ofensa à eficiência da persecução penal nos casos em que as autoridades aeronáuticas não possam estar imediatamente presentes no local do evento”, afirma a ação.
Segundo a PGR, não há necessidade de impedir que peritos criminais acompanhem o trabalho do Cenipa e busquem, “em coordenação com os profissionais do Sipaer, preservar a integridade das provas relevantes aos processos judiciais, como ocorre em diversos países”.
“Não tendo a investigação aeronáutica uma finalidade essencialmente criminosa, é perfeitamente possível que as autoridades responsáveis pela mesma não se preocupem ou não vejam elementos que, aos olhos dos órgãos envolvidos na persecução penal, possam ser capazes de sustentar a instauração de investigação criminal”, afirma. o Ministério Público.
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