Alguns dos principais responsáveis pelo plano de estabilização monetária e econômica mais bem-sucedido da história recente do país participaram, nesta segunda-feira (24), de debate promovido pela Fundação FHC, em São Paulo (SP), em comemoração aos 30 anos do plano Real.
Às vésperas de a moeda brasileira completar três décadas de existência, no dia 1º de julho, ex-ministros da Fazenda reuniram-se Pedro Malan Isso é Rubens Ricuperoos ex-presidentes do Banco Central (BC) Armínio Fraga, Gustavo Franco Isso é Pérsio Arida e o economista Edmar Bacha.
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Com exceção de Ricupero, que foi ministro da Fazenda no governo do ex-presidente Itamar Francoem 1994, sucedendo Fernando Henrique Cardoso (PSDB) responsáveis pela carteira, todos os demais faziam parte do chamado “núcleo duro” do real. Não é de surpreender que sejam apontados como “pais” do plano que pôs fim à hiperinflação no Brasil.
Em fevereiro de 1994, Itamar enviou ao Congresso Nacional a Medida Provisória (MP) que criou a Unidade Real de Valor (URV), precursora do real – uma espécie de “moeda fictícia”.
O plano foi concluído na virada de junho para julho daquele ano, quando o então presidente da República enviou aos deputados e senadores a MP de implementação do real. É a moeda brasileira mais longeva desde 1942.
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Nos 8 anos anteriores ao Real, o Brasil tinha 4 moedas diferentes e registrava uma inflação estratosférica de quase 2.500% ao ano, segundo dados do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA).
Pedro Malan
Pedro Malan foi Ministro da Fazenda durante os 8 anos do governo FHC. Também ocupou a presidência do BC entre 1993 e 1995, no governo de Itamar Franco.
Segundo Malan, o real foi resultado de um período de “400 dias que mudou o Brasil” – desde a posse de FHC no Ministério da Fazenda do Itamar, em maio de 1993, até o lançamento do real, em julho de 1994.
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“Houve aprendizado de anos anteriores, do Cruzado 1, do Cruzado 2, do Plano Bresser, do Plano Verão, do Collor 1, do Collor 2… Houve um histórico de pelo menos uma década e também um aprendizado das tentativas pré-reais de estabilização”, afirmou Malan durante debate na Fundação FHC.
O ex-ministro da Fazenda destacou ainda o desenvolvimento de “um programa de ação imediata”, divulgado três semanas após FHC assumir o Tesouro. “Foi muito importante porque ele já tinha definido um rumo, muito além da simples preocupação em controlar a inflação”, observou.
“Temos muito o que comemorar. Ao mesmo tempo, ainda temos um longo caminho a percorrer em termos de reformas para que o Brasil possa lidar com problemas fundamentais e responder questões básicas como por que o Brasil está crescendo pouco e por que é tão difícil realizar reformas no país” , acrescentou Malan.
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Pérsio Arida
Persio Arida comandou o BC, em 1995, e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), de 1993 a 1995. É considerado um dos “pais do Plano Real”, assim como Edmar Bacha.
No debate na Fundação FHC, o economista afirmou que a implementação do Plano Real foi ainda mais difícil do que a sua concepção.
“A implementação é muito mais difícil, na prática, do que ter a ideia. Implementação é tudo. As ideias acontecem quando alguém as implementa. O real é uma construção política que se beneficiou enormemente da dupla capacidade de FHC, que é ser, ao mesmo tempo, político e intelectual. Essas duas habilidades geralmente não coincidem em uma única pessoa”, disse Persio.
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O economista destacou a centralidade de FHC no real. “Ele era um homem de trajetória esquerdista e não chamava economistas de esquerda, mas sim economistas liberais da PUC-RJ. Ele financiou um plano de estabilização que nunca tinha sido feito antes e investiu nele o seu capital político”, disse ele.
Segundo o ex-presidente do BC, “o que aconteceu com o real é algo que não se repete”. “É difícil imaginar um ministro das Finanças que tenha capacidade de convencer um Presidente da República que tinha ideias diferentes”, destacou.
“O real, hoje, virou um bem público. O grande lastro do real, uma vez lançado e consolidado, é a própria democracia”, continuou Pérsio. “A democracia, no seu mecanismo eleitoral, penaliza o governante que não resolve o problema que mais afeta a população, mais ainda que o desemprego, que é a inflação.”
Edmar Bacha
Outro dos “pais do real”, Edmar Bacha afirma que a tarefa de implementar algo semelhante ao real hoje seria muito mais complicada de colocar em prática do que era há 30 anos.
“Em 1994, só precisávamos dos votos plenos do PSDB, PFL e PMDB. Os três juntos representavam 50% do Congresso. A negociação foi com Nelson Jobim, do PMDB. Hoje seria com o Centrão, certamente mais desagradável”, brincou o economista.
“Seria muito mais difícil porque o orçamento hoje é muito mais rígido e as emendas parlamentares obrigatórias são de alto nível”, explicou Bacha.
Assim como seus colegas, Edmar Bacha atribuiu a FHC o protagonismo e os maiores méritos pelo sucesso do plano.
“Só ele poderia fazer quatro coisas. Primeiro, reúna todos nós na equipe. Então, tenha confiança e capacidade com o Congresso. Terceiro, neutralize o comitiva de Itamar. E por último, comunicar com o público”, concluiu.
Gustavo Franco
O economista Gustavo Franco foi presidente do BC entre 1997 e 1999, entre o primeiro e o segundo mandato de FHC no Palácio do Planalto.
No evento da Fundação FHC, Franco disse ter ficado “impressionado com o interesse que o país demonstrou nos 30 anos” do plano. “Isso não aconteceu nos 10, 15, 20 ou 25 anos do real. O país agora demonstra interesse em olhar para esta experiência”, afirmou.
“Tivemos 15 anos consecutivos de inflação média mensal de 16%. Foram 16% ao mês durante 15 anos! Esse era o tipo de experiência que estávamos enfrentando naquela época. Não era possível ter uma vida econômica inteligente naquele ambiente”, lembrou o ex-presidente do BC.
Armínio Fraga
Falando por videoconferência, Armínio Fraga, que foi presidente do BC durante o segundo mandato de FHC, de 1999 até o final de 2002 – após a saída de Gustavo Franco –, afirmou que “o desenho do Plano Real foi brilhante porque fez com que o dinheiro reforma num ambiente indexado”.
“Surgiram muitos problemas que estavam escondidos pela inflação”, observou o ex-chefe da autoridade monetária.
“Mesmo com todo o esforço fiscal inicial, o Brasil rapidamente entrou em uma situação deficitária. Tornou-se então muito claro que o sistema bancário, não só privado mas também público, era uma espécie de parasita da inflação. Também rapidamente tiveram problemas e três dos seis maiores bancos privados do país faliram”, lembrou Armínio.
Rubens Ricupero
Rubens Ricupero, ex-ministro da Fazenda do Itamar, brincou ao lembrar que praticamente não teve participação na elaboração do Plano Real. “Eu nem sou economista”, disse ele.
Sua principal missão, como ele mesmo diz, era convencer Itamar Franco da viabilidade do plano e fazer com que o então Presidente da República não desistisse de implementá-lo.
Segundo Ricupero, em meio ao legado inquestionável do real, há espaço para grande lamentação.
“A maior tristeza que tenho no final da minha vida é ver que a responsabilidade fiscal não pegou. É muito difícil ter responsabilidade fiscal no país. Aqui ele se abandonou. Melhoramos e depois pioramos”, afirmou o ex-ministro.
30 anos de verdade
O real completa 30 anos no dia 1º de julho e carrega consigo o sucesso da estabilização econômica. Até então, o InfoMoney publicará uma longa série de conteúdos multimídia que abordam os diferentes aspectos envolvidos no Plano Real.
A série começou na última quinta-feira (20) com uma edição especial do podcast Selecionadores de ações, que entrevistou Gustavo Franco. Para o Selecionadores de açõesele relembrou momentos importantes do processo e analisou o futuro da moeda e da economia brasileira.
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