O juiz Felipe Barros, auxiliar da Inspetoria Geral de Justiça do Rio Grande do Norte, conduziu uma audiência de custódia inusitada na semana passada. Ao aprovar a prisão de um homem acusado de furto, detido pela população, o magistrado ouviu: “Vocês estão me dando medida preventiva? Acho que você nem usou roupa íntima no tribunal hoje. Preventivo sem eu dever? Vá colocar uma fralda, cachorro.”, disse Alisson, o prisioneiro.
A audiência de custódia durou menos de dez minutos e terminou com o magistrado oficiando no Ministério Público para apurar o desacato de todos os presentes na audiência. Também foi determinado que o Gabinete de Segurança Institucional do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte “fique de olho” nos acusados.
“Não me senti ameaçado, parecia mais rude do que qualquer outra coisa. Mas por precaução, vou encaminhar”, observou o juiz pouco antes de encerrar a audiência.
O caso foi registrado nesta quinta-feira, 26, seguindo o rito habitual de audiência de custódia – procedimento em que é avaliada a legalidade da prisão. Alisson respondeu a perguntas sobre sua detenção.
Ele disse que era cabeleireiro e disse ter “ferimentos decorrentes de tentativa de homicídio”. Alisson foi detido pela população após um crime de roubo e depois levado para a delegacia. Ele alegou que se machucou enquanto era contido.
Quando o juiz perguntou onde Alisson mora, ele citou um endereço de Afonso Bezerra e gritou: “Lá onde eu coloquei fogo em um veículo sem nem pegar, só com ordem minha. Sou mais perigoso que o Fernandinho Beira-Mar, basta estalar o dedo e o fórum explode.”
Alisson se referia ao líder da facção criminosa Comando Vermelho, que ficou detido no presídio de Mossoró até março deste ano. Após a prisão registrar a primeira fuga do sistema federal, ele foi transferido.
“E sou eu quem vai aparecer lá se você me der prisão. Você confirma? Com quem você está falando aqui? Que sou de Carneiros”, finalizou, em referência à facção criminosa que atua no Rio Grande do Norte.
Durante a audiência, o desembargador Felipe Barros não mudou de tom. “Certo”, disse ele após as ameaças de Alisson. Enquanto o magistrado e o representante do Ministério Público discursavam na audiência, o preso ria, fazia caretas e batia palmas.
“Fico feliz que você saiba que também é uma autoridade aqui”, respondeu o prisioneiro. “Peguei três anos por desacato às palavras. Acho que são três minutos a mais que você tem para falar comigo”, completou.
O juiz então perguntou se Alisson tinha alguma reclamação sobre os policiais que o prenderam. Ele respondeu que não, que os agentes foram gentis com ele. Quando chegaram ao local, Alisson já estava detido pela população. Ele afirmou que machucou o olho na confusão com o povo.
“Estou há dois dias dormindo numa delegacia com os policiais me dando salsichas. Vou reclamar com a polícia? A polícia me trata com mais respeito do que a população da cidade. Parabéns à polícia”, disse ele, batendo palmas.
A decisão de manter Alisson preso seguiu parecer do Ministério Público do Rio Grande do Norte. O procurador destacou que o preso já respondeu pelos crimes de ameaça, roubo e extorsão. Ele ressaltou que Alisson é uma pessoa perigosa e pode ameaçar o juiz. O representante do MP na audiência ainda “honrou” a paciência do desembargador Felipe Barros.
A prisão preventiva foi justificada pelo histórico de vários crimes atribuídos a Alisson, apesar de o roubo que o levou à prisão não ter sido praticado com violência ou grave ameaça, observou o magistrado.
Uma mulher presa na mesma confusão acabou liberada após cumprir medidas cautelares, por não ter antecedentes. Alisson bateu palmas quando o juiz anunciou a soltura da menina.
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