Após cerca de dois meses de briga na Justiça, uma mulher que estava grávida de um feto com malformações e sem chance de vida fora do útero conseguiu fazer um aborto legal na Bahia.
Segundo a Defensoria Pública do Estado, o órgão buscava fazer valer o direito ao aborto desde julho e, apesar dos laudos médicos indicarem gravidez incompatível com a vida, a interrupção foi negada.
A Segunda Câmara Criminal do Tribunal de Justiça da Bahia reverteu a decisão de primeira instância e autorizou o procedimento, que foi realizado no último final de semana.
Para a coordenadora do Especialista em Direitos Humanos e do Núcleo de Defesa da Mulher, Lívia Almeida, a decisão chegou um pouco tarde para a gestante, mas tem peso histórico.
“É uma decisão muito fundamentada e abordou vários pontos muito importantes, como o Estado laico e o direito à saúde mental. Não é justo submeter uma mulher a algo tão cruel como gestar e dar à luz um filho e depois enterrá-lo. Espero que abra um caminho menos doloroso para os próximos que virão”, destacou o defensor público.
A decisão unânime, proferida em 29 de agosto, indicou que a Segunda Câmara também reconheceu os riscos para a saúde mental da imposição de uma gravidez sem chances de vida.
A decisão destacou o risco à saúde mental no caso de obrigar uma mulher a manter uma gravidez contra a sua vontade e mesmo diante de um diagnóstico “de inviabilidade de vida extrauterina”. Ao processo foi anexado um laudo de uma psicóloga, atestando o sofrimento que a gestante vem passando.
Mesmo com exames médicos indicando a incompatibilidade do feto com a vida, o aborto foi evitado em primeira instância. O Tribunal entendeu os laudos médicos e afirmou “ausência ou divergência de elementos técnicos que justifiquem a atuação”. Com isso, novos exames foram solicitados.
Moradora de município do interior do estado, a mulher foi encaminhada à Defensoria Pública da Bahia “com diagnóstico de feto com pulmões, rins e coração comprometidos, além de ausência de líquido amniótico, atingindo mortalidade neonatal taxa de 90-95%”. A gestante foi encaminhada ao órgão para fazer valer seu direito ao aborto com 22 semanas de gestação.
A decisão que garantiu o procedimento só foi tomada quando a gravidez estava com aproximadamente 27 semanas. O tempo médio entre o recebimento, o arquivamento e a autorização judicial dos processos de mesma natureza recebidos pelo Núcleo de Defesa da Mulher (Nudem) é de uma semana.
Ainda segundo a Ouvidoria, entre 2022 e maio deste ano, Nudem recebeu 73 casos de diagnóstico de gravidez incompatível com vida não prevista no ordenamento jurídico baiano.
A maioria dos casos (57,5%) chega à instituição com pelo menos 20 semanas de gravidez (57,5%) e são mulheres residentes em municípios do interior (56,1%). Os dados são do observatório de atendimento à interrupção da gravidez com malformações fetais incompatíveis com a vida extrauterina do Nudem.
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