Globalmente, 60% de todos os materiais produzidos a partir de fontes não renováveis podem ser substituídos por fontes renováveis. Mas é preciso investimento em investigação e tecnologia e, claro, uma mudança cultural.
“O maior desafio da economia circular e da reciclagem é a mudança comportamental. É como aprendemos a fazer as coisas. Desde a Revolução Industrial, o sucesso de uma empresa tem sido fazer, fabricar, produzir, produzir, vender, vender. É daí que vem o lucro. Quanto mais eu vender, melhor. Quanto menos meu produto durar e eu vender o próximo, melhor. Este é o modelo económico estabelecido e é difícil mudar isto.”
Quem diz isso é Guilherme Brammer, engenheiro de materiais e especialista em economia circular. A entrevista faz parte Sustentabilidade CNNPrograma da CNN apresentado pelo âncora Márcio Gomes e pelo analista de Meio Ambiente e Clima, Pedro Cortes. A edição exibida neste sábado (31) discutiu os desafios e perspectivas para impulsionar a economia circular e a reciclagem, além de destacar algumas iniciativas já presentes no nosso dia a dia.
”O Brasil dá exemplos em diversos tipos de materiais. Somos uma das maiores recicladoras de papelão ondulado do planeta. Somos um dos maiores recicladores de animais de estimação do planeta”, explica Brammer. E isso tem um caráter social.
“Os catadores são atores fundamentais na economia circular no Brasil, 90% dos nossos resíduos recicláveis passam pelas mãos de um catador. Saíram da invisibilidade para ganhar destaque”, completa.
“Globalmente, todos os projetos que você vê com sucesso, com essa escala, são projetos em que a indústria trabalhou cooperativamente. Por outras palavras, não foi uma indústria que levantou uma bandeira dizendo “veja como sou mais verde do que você”. Foi um setor que se sentou e estabeleceu um processo de cooperação mútua e, consequentemente, as coisas acontecem quase naturalmente”, afirma o especialista.
Na entrevista, Brammer também destacou as medidas tomadas pela indústria brasileira sobre o assunto, que já inclui um estudo sobre a capacidade de reaproveitamento de um determinado produto antes mesmo de ele chegar às prateleiras.
“O que é mais interessante observar nos últimos anos é que não funciona apenas quando o produto já está no mercado. Antes de lançar um produto no mercado, vamos conversar com muita gente para ver se vai impactar ou não a sociedade”, afirma.
“A obsolescência planejada, que é programar seu produto para durar menos, está começando a ser muito criticada globalmente. Portanto, as empresas estão sendo forçadas a repensar a forma como fabricam produtos”, explica.
O especialista também discutiu um dos principais desafios da indústria do ponto de vista das práticas sustentáveis: o uso do plástico. Hoje, cerca de 11 milhões de toneladas de plástico poluem o ambiente marinho. Se nada for feito, até 2040, esse número poderá chegar a 30 milhões. Todos os ambientes do planeta já estão contaminados por plástico. E os fatores para isso são vários, como baixa cobertura de coleta, lixões inadequados e ineficiência da coleta seletiva.
“Se banirmos o plástico da sociedade, os nossos carros pesarão três ou quatro vezes mais. Para ter o mesmo desempenho que você tem hoje, você terá que usar muito mais combustível, tanto fóssil quanto elétrico. Portanto, o plástico bem utilizado tem grande valor para a sociedade. A questão é que é tão fácil de usar, extrair e transformar, que pode ser usado para qualquer coisa.”
O especialista cita os agitadores de café como principal exemplo. “Leva milhões de anos para o petróleo se transformar em petróleo, alguns meses para esse petróleo se tornar plástico, você injeta, distribui. Aí você coloca sua xícara, seu café, gira uma ou duas vezes e você nunca mais vai ver essa pazzinha na sua vida.”
Ele está esperançoso, no entanto, de que isso possa vir na forma de pressão da sociedade como um todo.
“As grandes empresas globais estão sendo pressionadas pelos seus consumidores e pelos seus investidores, principalmente, para se tornarem mais sustentáveis, para impactarem menos o planeta com o que vendem no mercado. Então se tornou uma onda global. A economia circular está presente nos indicadores de desempenho de grandes executivos e grandes empresas. E aí quando você vira um indicador C-Level para grandes corporações, isso começa a virar projetos estratégicos”, completa.
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Guilherme Brammer, engenheiro de materiais e especialista em economia circular, fala à CNN Sustentabilidade • CNN Brasil / Reprodução
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