Claudia Sheinbaum venceu as eleições no México e será a primeira mulher a ocupar a Presidência do país. Ela é a sucessora de Andrés Manuel López Obrador (AMLO), atual chefe de Estado.
Portanto, deve tentar realizar as reformas do atual governo, como a do Judiciário.
Sheinbaum faz parte do partido Morena, que faz parte da coalizão Sigamos Haciendo Historia, com o Partido del Trabajo e o Partido Verde Ecologista.
Resultados preliminares do Instituto Nacional Eleitoral do México indicam que o bloco obterá entre 346 e 380 cadeiras na Câmara dos Deputados, superando o necessário para que a chamada “maioria qualificada” aprove as reformas da Constituição, que é de 334 votos .
No Senado, por sua vez, a coligação deve obter entre 76 e 88 cadeiras —para conseguir maioria qualificada nesta Casa, são necessários 85 senadores.
Assim, existe um cenário em que o bloco governista obterá maioria no Congresso para aprovar as reformas.
Thiago de Aragão, CEO da Arko Internacional em Washington, avalia que Sheinbaum aprendeu observando o governo de AMLO, e poderia, em vez de trazer uma reforma constitucional pesada, tentar aprová-la em partes.
“Os presidentes só podem mudar a estrutura operacional de um país se tiverem muito dinheiro para gastar ou muito poder para usar. O poder, numa democracia, tem barreiras muito claras e Sheibaum não tem tanto dinheiro”, comenta.
Reforma Judiciária
O plano de governo de Sheinbaum defende que juízes e magistrados, por exemplo, sejam eleitos pela população. Além disso, a nova presidente afirma que apoiará a criação do Tribunal Judicial Disciplinar.
A esse respeito, Thiago Vidal, diretor de Análise Política da Prospectiva Public Affairs LATAM, considera que o Morena, partido de Sheinbaum e López Obrador, tem um péssimo relacionamento com os órgãos de controle e o Judiciário, pois entende que eles não são representativos e não diálogo com a população.
“Existe o risco de politização e enfraquecimento do Judiciário, como já acontece em vários países que optam por esse caminho”, alerta Vidal.
Leonardo Trevisan, professor de Relações Internacionais da ESPM, concorda com a avaliação de que esta medida pode ser perigosa para a democracia mexicana.
“A função de você votar para juiz é, de alguma forma, perpetuar para sempre o mesmo grupo político”, destaca, lembrando que as campanhas eleitorais têm financiadores e envolvem muitos gastos, que podem influenciar a atuação dos eleitos.
Consolidação da Guarda Nacional e militarização
O México está em constante luta contra os cartéis, conhecidos como algumas das organizações de tráfico de drogas mais perigosas e influentes do mundo.
Entre as medidas para enfrentá-los, Sheinbaum propõe a “consolidação” da Guarda Nacional e sua coordenação com as polícias estaduais.
A Guarda Nacional foi criada em 2019, em substituição à Polícia Federal Mexicana, acusada por López Obrador de corrupção.
Esta força tem como objetivo “exercer a função de segurança pública sob responsabilidade da Federação e, se for o caso, colaborar temporariamente em tarefas de segurança pública que sejam de responsabilidade de entidades federais ou municípios”, segundo o próprio governo mexicano.
Thiago Vidal explica que o governo levaria então uma força civil para o Ministério da Defesa. “Isso é um risco para um país onde os militares já têm muita influência”, avalia.
Nos últimos anos, muitos cargos em diversos setores têm sido comandados por militares. Em maio de 2022, 163 cargos nos setores portuário, aviação, saúde, migração, transportes e até bancário eram ocupados por membros das Forças Armadas, da ativa ou da reserva, segundo o Centro de Investigación y Docencia Económicas.
Trevisan considera que López Obrador conseguiu construir uma imagem de que os militares são “incorruptíveis”, apontados em pesquisas como a instituição mais respeitada do México.
Assim, o professor acrescenta que a “consolidação” da Guarda Nacional representaria a militarização da segurança pública. “A função do aparelho militar é estratégica para a Defesa. Não se confunde com as funções do policiamento interno”, alerta.
Reduzir congressistas e proibir a reeleição parlamentar
Outras medidas propostas por Claudia Sheinbaum estão relacionadas ao Congresso, como:
- Eliminar 200 deputados federais e 64 senadores, reduzindo o Congresso a 300 deputados e 64 senadores;
- Estabelecer parâmetros “objetivos populacionais que definam o número de deputados e vereadores locais”;
- Proibir a reeleição de deputados e senadores;
Vidal explica que estes pontos estão relacionados com o entendimento de López Obrador, que deve ser mantido no governo de Sheinbaum, de que um Estado que gasta muito, em tese, pode ter mais desvios para corrupção.
“Ele [AMLO] teve esse discurso [de austeridade fiscal] em todo o governo, não por defesa da ortodoxia fiscal, mas porque acredito que um Estado que gasta muito leva à corrupção, queira ou não”, destaca.
O especialista destaca que qualquer mudança no sistema político-partidário acarreta um risco, tendo em conta, por exemplo, se se trata de uma “renovação do sistema” ou de um “capricho” do partido que detém a maioria.
No entanto, avalia que este não é um risco particular para o México, existindo em qualquer país que se proponha alterar a forma de representação.
Leonardo Trevisan, por sua vez, destaca que se trata de uma medida de difícil implementação, pois seriam os próprios parlamentares que votariam uma possível redução do número de cadeiras no Congresso.
Além disso, alerta que existem confrontos políticos internos entre regiões mais industrializadas e regiões mais rurais no México, o que dificultaria o reequilíbrio de forças numa possível reforma do Congresso.
Thiago de Aragão acrescenta ainda que esta é uma proposta que poderá impactar o apoio dentro do Congresso, sendo uma das reformas que Sheinbaum tentará implementar num segundo momento.
Transparência de dados públicos
Outra medida proposta por Sheinbaum é a integração do órgão de transparência e proteção de dados públicos, que é autônomo, ao governo.
Segundo o especialista, isso poderia enfraquecer a disponibilidade de dados e levar à falta de publicidade por parte das autoridades públicas.
*Com informações da CNN Espanhola
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