O namorado da viúva realmente passou por aqui. Na rua Montmorency, em Paris, você encontra o casa mais antiga da capital francesauma casa de 617 anos onde morava o alquimista Nicolau Flamel – o namorado da viúva cantado por Jorge Ben em “A Tábua de Esmeralda”, álbum que surgiu após uma visita de Jorge Ben àquela casa em 1973.
Hoje, a casa abriga Auberge Nicolas Flamelum restaurante que reúne histórias de tempos imemoriais, quando alquimistas andavam pela Terra, e conecta amantes da boa comida, fãs de Harry Potter e uma lenda fundamental da música brasileira.
“Já ouvi muitas histórias sobre esta casa, é um local com milhares de histórias, basta olhar para as paredes para ver que aqui aconteceram muitas coisas. Minha história de alquimia é a cozinha”, diz Alan Geaam, chef libanês que dirige o Auberge Nicolas Flamel e tem uma história de vida um tanto fantástica.
Em 1999, Geaam chegou a Paris com uma mochila nas costas. Aos 25 anos, ainda sem saber o que faria da vida, começou a gostar de cozinhar quando começou a trabalhar como lavador de pratos em um dos milhares de restaurantes da cidade. “Um dia passei por esta rua e vi esta casa, uma casa antiga, olhei pela janela e percebi que era a casa do Nicolas Flamel”, lembra Geaam. “Mas eu só o conhecia de Harry Potter.”
Flamel é personagem fundamental na trama do pequeno bruxo: foi ele quem criou a Pedra Filosofal, substância que transformaria metais comuns em ouro — o Santo Graal dos alquimistas. “Ouvi dizer que era um restaurante que funcionava aqui e que estava à venda”, diz Geaam. “Falei com o proprietário e ele disse que precisava de um gerente de quarto, e eu disse que poderia fazer isso – mas nem sabia o que era um gerente de quarto.”
Geeam conseguiu o emprego e aprendeu sozinho os meandros da culinária. “Minha mãe, em casa, me ensinou a cozinhar, e meu pai, que tinha mercearia, me ensinou o comércio: foram as escolas da vida”, conta o chef. Em 2005 decidiu comprar o restaurante através de financiamento e aos poucos foi transformando-o até atingir a forma atual, algo entre a modernidade e a tradição que vai da cozinha ao teto.
A fachada, por exemplo, mantém a inscrição original da época de Flamel: “Nós, os trabalhadores que moramos no alpendre desta casa, que foi construída no ano de graça mil quatrocentos e sete, somos obrigados cada um a dizer todos os dias um Pai Nosso e uma Ave Maria, pedindo a Deus que a sua graça perdoe os pobres pecadores já falecidos. Amém”.
No interior, o mobiliário moderno combina com as paredes de pedra e as colunas de madeira maciça. O menu varia entre os 100 e os 150 euros, uma equipa de 14 pessoas prepara pratos clássicos da cozinha francesa. “Aqui é cozinha francesa, cozinha sazonal, cozinha gastronómica mas também cozinha de verdade, borrego, lentilhas, espargos, suflês, pratos tradicionais franceses”, explica Geeam.
Anos depois de abrir o Auberge Nicolas Flamel, o chef Geeam abriu outro restaurante e, em 2018, conquistou sua primeira Estrela Michellin – o único chef de origem libanesa na França a deter o título. “Mas esta ainda é a cozinha da minha mãe, onde aprendi tudo”, diz ele. “Nosso público varia entre fãs de comida, fãs de Harry Potter e pessoas que querem conhecer a casa mais antiga de Paris.”
Os fãs de Jorge Ben não entram na lista oficial, mas quem sabe. Em entrevistas, o artista afirmou que visitou a casa em 1973, quando teve uma visão que o inspirou a compor uma de suas obras-primas, “A Tábua de Esmeralda”. Completando 50 anos em 2024 como um dos maiores cânones da música brasileira, o álbum se inspira nas lendas da alquimia e deve muito à figura de Flamel e sua casa. “Minha Pedra Filosofal é a Pedra da Felicidade, que encontrei aqui”, diz Geeam. “Não vi música aqui, mas vi culinária.”
Auberge Nicolas Flamel
Endereço: 51 Rue de Montmorency, 75003 Paris
Horários: Terça a sábado, das 12h00 às 13h30, das 19h30 às 21h30
Valores: 100 a 200 euros
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