A imposição de um teto para o crescimento da dívida do cartão de crédito gerou resultados positivos, mas o governo ainda vê problemas no instrumento ligados à falta de transparência sobre o custo para o consumidor, disse o secretário de Reformas Econômicas do Ministério da Fazenda, Marcos Pinto, admitindo que as discussões sobre mudanças mais radicais no instrumento esfriaram.
Em entrevista à Reuters, ele afirmou ainda que o Tesouro está na fase final das discussões sobre melhorias nos produtos financeiros, e deve apresentar propostas para aumentar a eficiência dos mercados de capitais, seguros, previdência e crédito.
Depois de o governo ter limitado o crescimento da dívida de cartão de crédito ao dobro do seu valor original, alteração que entrou em vigor em janeiro, Pinto argumentou que a medida teve efeito ao evitar que as dívidas de cartão se transformassem numa bola de neve, problema que tinha tem afectado principalmente as pessoas mais vulneráveis.
“Isso não significa dizer que atingimos um estado ideal na indústria de cartões. Eu não acho. Acho que precisamos avançar principalmente na informação ao consumidor”, disse.
Conforme determinação do governo, a partir de julho, os consumidores poderão realizar a portabilidade das dívidas do cartão de crédito, e também terão acesso a um extrato de crédito descritivo em suas faturas, com informações sobre a taxa de juros média anual ponderada, nominal e efetiva.
Para Pinto, a disponibilização desta informação deverá desempenhar um papel importante na utilização mais consciente do instrumento, dada uma realidade em que os consumidores escolhem os seus cartões de crédito com base principalmente em outros atributos e benefícios, sem clareza quanto às implicações financeiras da rolagem de dívidas. . .
A discussão sobre formas de reduzir custos com cartão de crédito ganhou destaque no ano passado, com atritos entre os setores participantes desse mercado, após o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, sugerir uma possível extinção do crédito rotativo e limitação de juros de parcelamento- livre.
Mudanças deste tipo foram deixadas de lado após limitarem o crescimento da dívida.
“A discussão sobre uma mudança radical no produto eu acho que realmente esfriou, o que temos são essas mudanças prospectivas nos aspectos informacionais que devem acontecer no futuro. Acho que não há dúvida, e acredito que a própria indústria de cartões de crédito reconhece, que isso é um problema do produto”, afirmou Pinto.
A inadimplência na linha de crédito rotativo do cartão – linha de crédito acionada automaticamente quando o titular do cartão não paga a totalidade da fatura – ficou em 52,9% em abril, queda de 1 ponto no ano.
Para os cartões de crédito parcelados, esse percentual permaneceu inalterado em 10,1%.
Em relação às taxas de juros, houve redução nos últimos meses, mas ainda em patamar elevado. Taxas de juros rotativos eram de 424% ao ano em abriluma queda de 18,6 pontos percentuais nos primeiros quatro meses de 2024.
As parcelas do cartão, por sua vez, eram de 182% ao ano, queda de 14,9 pontos percentuais neste ano.
Agenda financeira
O Ministério das Finanças concluirá em Julho os debates sobre a melhoria dos instrumentos financeiros, discussão realizada com representantes do sector privado e que se materializará com a publicação de medidas nos próximos meses, disse o secretário.
A maioria das iniciativas não depende da aprovação do Congresso.
A certa altura, o governo fará propostas para desburocratizar os investimentos feitos por estrangeiros no Brasil. Os ajustes serão feitos por meio de regulamentação da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e alterações nas obrigações tributárias da Receita Federal.
O secretário afirmou ainda que o governo procurará estimular o acesso das pequenas e médias empresas ao mercado de capitais, reduzindo os obstáculos à emissão e negociação de dívidas privadas.
A ideia é alterar as regras da CVM para reduzir a exigência de prestação de informações, agilizar cadastramentos e reduzir custos.
Num outro eixo, segundo ele, o governo pretende reduzir os constrangimentos em relação aos tipos de investimentos que as seguradoras e entidades de pensões complementares podem fazer, com o objectivo de estimular a diversificação das aplicações e aumentar a rentabilidade para os segurados.
Depois de fazer ajustes no Programa de Garantia da Atividade Agrícola (Proagro) para reduzir os gastos públicos, o governo prepara agora medidas para facilitar o acesso e aumentar a eficiência do seguro rural privado, disse Pinto.
“A ideia é fazer crescer o mercado de seguros rurais para não ficarmos dependentes apenas do Proagro, é isso que está sendo estudado”, afirmou.
Na agenda que depende do Congresso, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, anunciou para março o envio de um projeto de lei com ajustes na tributação das aplicações financeiras, mas o plano ainda não entrou em vigor.
Segundo o secretário, não houve decisão de segurar o texto, que teve conteúdo antecipado pela Reuters. Ele afirmou que a expectativa é que seja enviado ao Congresso “em breve”, após o amadurecimento dos pontos que envolvem discussão com a Receita e a área jurídica do governo.
Pinto afirmou ainda que está confiante na aprovação de projetos da agenda microeconômica do governo que já tramitam no Congresso, incluindo ajustes em regras para instituições financeiras em crise, regras de incidência de juros em processos judiciais e simplificação de execuções extrajudiciais .
Em um dos pontos considerados prioritários pela secretaria, o projeto que busca agilizar processos de falência de empresas e ampliar o poder dos credores foi alterado na Câmara e passou a sofrer resistência do agronegócio, dos bancos e do Judiciário, segundo o secretário .
“Queremos dialogar com todos esses setores para criar um projeto de consenso que possa ser apoiado”, afirmou.
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