O plano do Ministro das Finanças, Fernando Haddad, de dar prioridade à tributação das grandes empresas para aumentar as receitas da União poderá trazer riscos significativos a longo prazo, resultando em danos para o desenvolvimento empresarial, a eficiência produtiva e o progresso económico do país.
É o que mostra o estudo “Tributação das Grandes Empresas — Distorções, Armadilhas e Realidade”, elaborado por Samuel Pessôa, doutor em Economia e pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV).
O documento, criado a pedido da Associação Brasileira das Empresas Abertas (Abrasca), entidade que reúne 453 das mais importantes empresas de todos os setores do país, trata de tributação, má alocação de fatores de produção e baixa produtividade , além de custos de impostos que “discriminam as empresas com base no tamanho”.
A preocupação central levantada pelo estudo é a estratégia do Tesouro de priorizar o aumento da carga tributária focada nas empresas com Lucro Real — aquelas cujo faturamento anual total ultrapassa R$ 78 milhões.
O texto faz referência a um documento recente do Ministério da Fazenda que vê maior eficiência na arrecadação do Imposto de Renda Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) para empresas que adotam o regime do Lucro Real, em comparação com aquelas que optam. para Lucro Presumido (com receita de até R$ 78 milhões por ano) ou Simples Nacional (receita bruta anual de até R$ 4,8 milhões), como pequenas empresas e microempreendedores individuais.
Segundo o documento, nas circunstâncias mais favoráveis, a eficiência de arrecadação é de 69% para as empresas do Lucro Real, enquanto para as empresas do Lucro Presumido e do Simples Nacional é de 54% e 56%, respectivamente.
Segundo o texto, embora seja “fácil” tributar as grandes empresas, o plano poderia “agravar a tendência de discriminação nos custos fiscais e de conformidade com base no tamanho das empresas”, como acontece em toda a América Latina.
“Há evidências abundantes, na literatura recente sobre desenvolvimento económico, de que este tipo de discriminação reduz a produtividade das economias, comprometendo a capacidade de crescimento a médio e longo prazo”, diz o documento.
O documento aponta ainda que, ao analisar a carga tributária sobre os lucros em comparação com o regime internacional, o Brasil tributa os lucros das empresas a uma alíquota superior à média da economia, considerando o estágio de desenvolvimento econômico do país.
O texto também destaca uma má alocação de recursos na economia entre 1995 e 2022. Cita uma queda na taxa de poupança, dificuldades na educação da força de trabalho, aumento dos custos de conformidade devido à complexidade fiscal e dificuldades na integração nas cadeias de valor globais, como factores relacionado ao baixo crescimento da economia brasileira.
Ainda segundo a pesquisa, assim que eleito, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) decidiu aumentar os gastos públicos em cerca de R$ 150 bilhões de forma permanente. A medida, mostra o texto, resultou num aumento do défice primário estrutural da União em 1,2% do PIB, segundo dados da Instituição Fiscal Independente (IFI).
Portanto, o estudo diz que é necessário questionar se as medidas relacionadas com a tributação das grandes empresas são de facto eficazes, e também se é “justo” que apenas as empresas que operam sob o regime do Lucro Real suportem todo o peso da consolidação fiscal.
“Apesar de compreender as razões do Tesouro e o senso de urgência do ministro em buscar bases tributárias para cobrir o déficit público, tenho motivos para me preocupar com os impactos da estratégia na capacidade de crescimento de médio e longo prazo da economia brasileira”, destaca Pessôa.
deputado de compensação
Na última terça-feira (4), a Fazenda apresentou Medida Provisória (MP) que visa colmatar brechas na legislação sobre crédito presumido de PIS/Cofins não reembolsável e compensação limitada de PIS/Cofins.
A proposta, segundo o ministério, daria uma margem de R$ 29,2 bilhões aos cofres públicos para compensar as isenções de impostos sobre a folha de pagamento em 17 setores da economia e também a redução da alíquota previdenciária dos municípios até 2027.
A MP propõe ainda a extensão da proibição de reembolso em dinheiro aos créditos presumidos de PIS/Cofins, visando evitar o que tem sido caracterizado como “tributação negativa” ou “subvenções financeiras” para setores específicos.
O texto caiu como uma “bomba” e recebeu forte reação negativa de setores da economia, principalmente de grandes empresas, e de parlamentares, que chegaram a classificar o texto como ilegal.
Nesta sexta-feira (7), Haddad disse que o texto foi “mal interpretado” e que a resistência à medida foi fruto do “calor do momento”.
“Às vezes as pessoas nem leram a MP e já tiram conclusões a respeito. Existe uma equipe técnica na Receita Federal para explicar os números. É natural esse tipo de coisa, um setor ou outro reclama, ninguém que tem privilégio quer abrir mão. É natural, mas temos que levar em conta o país”, disse ela a jornalistas em São Paulo.
Mesmo assim, Haddad está confiante de que conseguirá negociar com o Congresso. Lembrou que “nenhuma medida” apresentada por eles “voltou” e que é preciso “ter calma”, “conversar e construir junto” com o Congresso.
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