Chegou a hora, como disse o presidente da Reserva Federal, Jerome Powell, durante o simpósio económico de Jackson Hole, há menos de um mês. A esperada “Super Quarta” de setembro deverá ser marcada por movimentos diversos dos comitês de política monetária: o Fomc deverá começar a ajustar as taxas para baixo nos EUA e o nosso Copom provavelmente fará um movimento contrário, elevando a Selic. Quais são as razões para isso?
Os economistas dizem que estes momentos estão relacionados com o equilíbrio entre a confiança no exterior de que o processo de desinflação continua – embora tenha perdido velocidade – e a incerteza no Brasil de que uma recuperação dos preços está à espreita, devido a inconsistências políticas e económicas.
Existem também diferentes leituras sobre como a actividade económica aquecida pode interferir na política monetária. Nos EUA, há esperança de que o pior momento de transferência para os preços do poderoso mercado de trabalho já tenha ficado para trás. É também necessário evitar que uma aterragem muito forçada da economia conduza a uma recessão no futuro, interferindo com o objectivo de emprego da Fed.
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No Brasil, o baixo desemprego, o aumento dos rendimentos e uma política fiscal ainda frouxa mantêm as expectativas de inflação teimosamente bem acima da meta perseguida pelo BC. E o momento é de reforçar a credibilidade da autoridade monetária, ainda em recuperação após o golpe sofrido em maio, quando uma decisão dividida entre os membros do Copom lançou uma sombra sobre a nova gestão, que assumirá em 2025.
FOMC
E o que esperar das decisões de hoje? Nos Estados Unidos, não se acredita em nenhum outro anúncio além do início de um ciclo de cortes. A dose, porém, ainda é tema de discussões. Até à semana passada, na ferramenta FedWatch do CME Group, as probabilidades mais elevadas eram para um início gradual, com uma redução de 25 pontos base dominando 66% das apostas. Ontem o placar já havia mudado, com 66% de chance de corte de 0,50 p.p.
Não parece uma decisão fácil. Para Gustavo Sung, economista-chefe da Suno Research, o Fed deveria começar mais devagar, promovendo três cortes consecutivos de 0,25 p.p., levando as taxas de juros no final do ano para uma faixa entre 4,50% e 4,75% anuais.
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Embora comente que o Fomc parece estar mais preocupado com a evolução do mercado de trabalho do que com a inflação, o que abriria a possibilidade de um corte maior, Sung acredita que a autoridade monetária manterá uma postura cautelosa neste início de ciclo.
“Os dados recentes da actividade económica indicam que a indústria está a enfrentar dificuldades em ganhar impulso, com a confiança empresarial num nível contraccionista. Os sectores dos serviços e do comércio retalhista continuam a apresentar crescimento, o que contribui para uma aterragem suave (‘pouso suave’) da economia”, afirma.
A análise do Bank of America vai na mesma linha, de que a Fed manterá o seu “optimismo cauteloso” e é altamente dependente de dados. “Esperamos que o Fed reduza as taxas em 25 pontos base na sua reunião de setembro. A mensagem geral será provavelmente cautelosamente optimista. O cenário base ainda é uma aterragem suave, mas a Fed está vigilante quanto aos riscos descendentes para o seu mandato de emprego”, comenta o grupo de investimentos.
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Para o BofA, o mais importante é que os cortes nas taxas não sigam uma trajetória predefinida. Por outras palavras, a Fed tomará as suas decisões reunião a reunião, com base nos dados recebidos. É por isso que cortes excessivos estarão em cima da mesa em reuniões futuras.
O Banco comenta ainda que, assim como os discursos do presidente Jerome Powell após a decisão, será importante observar os novos dados do gráfico de pontos, as projeções sobre diversos indicadores que os diretores do BC americano renovam a cada três meses. Talvez isto dê pistas sobre a dimensão do ciclo de flexibilização pretendido.
Sobre o impacto desta decisão, Ricardo Martins, economista-chefe da Planner Investimentos e presidente executivo da Apimec Brasil, acredita que o corte de 0,25% desagradará os mercados, impondo lucros às bolsas, mercados que tiveram bom desempenho ao longo do ano.
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“Para o mercado, o Fed já poderia ser mais agressivo cortando 0,5% diante de um mercado de trabalho que está desacelerando, mas não encolhendo, já que as demissões não são vistas como predominantes nesta desaceleração, bem como aumentos substanciais nos pedidos de ajuda-desemprego.”
Copom
Se nos EUA o início de um ciclo de cortes parece inevitável, a realidade brasileira vai na direção oposta. O Índice de Preços Equus Selic (IEPS), calculado pela Equus Capital por meio de Inteligência Artificial, estima em 76,2% a probabilidade de o BC optar pelo aumento de 0,25% na taxa básica de juros. Na véspera da última reunião do Copom, em julho, essa chance era de apenas 17,5%.
O que mudou desde então? A XP destaca que o cenário para a inflação é preocupante. Não pelos dados atuais do IPCA em si, já que o último de agosto apresentou deflação de 0,2%. O problema é que a inflação dos serviços básicos permanece em níveis elevados (cerca de 5% em termos anualizados), enquanto a inflação dos bens industriais, que estava perto da estabilidade, voltou a acelerar, para cerca de 3%.
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“Assim, embora aproximadamente em linha com as projeções, a inflação ao consumidor permanece claramente acima da meta, sem sinais de arrefecimento”, comenta a área de Macro Research em relatório.
Embora os preços internacionais das matérias-primas estejam a cair, especialmente o petróleo bruto, a taxa de câmbio permanece sob pressão e os indicadores de actividade foram mais fortes do que o esperado.
Com esse quadro, a XP acredita que o Copom aumentará por unanimidade a taxa Selic em 25 pontos-base nesta semana, de 10,50% para 10,75%, e que deverá aplicar mais duas doses de 0,50 p.p. em novembro e dezembro e mais 0,25% em Janeiro, elevando a taxa anual para 12%. Isto seria suficiente para trazer as expectativas de inflação de volta à tendência de tensão pré-mercado.
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“Em relação à comunicação do Copom, a mensagem mais eficaz seria “faça o que for preciso”. Na nossa opinião, seria arriscado fornecer orientações sobre o ritmo dos aumentos futuros ou sobre a magnitude global do ciclo de aperto. A palavra ‘gradual1 provavelmente aparecerá no comunicado pós-decisão, com base em sinalizações recentes dos membros do Copom”, afirma XP.
O Goldman Sachs, por sua vez, concorda com o diagnóstico, mas diverge apenas no tamanho da dose de juros, esperando uma taxa de, no máximo, 11,75% em janeiro. Mas tudo dependerá da divulgação dos dados que virão adiante.
“O risco para a nossa projeção básica para a Selic está equilibrado. Se o real e as expectativas não melhorarem, não descartaríamos um ciclo de aumento mais profundo de 150-175 pontos-base”, diz o relatório do banco. Por outro lado, lembre-se que um real mais forte e um melhor equilíbrio dos riscos inflacionários poderiam levar a um ciclo de aumento mais brando de 100 pb.
Para o Goldman, a dinâmica macro, fiscal e financeira doméstica brasileira é tal que o Copom corre o risco de perder credibilidade se não reagir à clara deterioração do equilíbrio dos riscos inflacionários e apenas torcer pelo melhor. “Ou seja, se o Fed não estivesse cortando, provavelmente teríamos um ciclo de alta mais agressivo”, pondera.
O Itaú, por sua vez, também calcula a taxa Selic em 12% em janeiro, com os cortes a partir de hoje em 0,25 pp “A autoridade monetária provavelmente renovará no comunicado sua promessa de vigilância e compromisso firme de convergir a inflação para a meta. A maioria dos membros deverá enfatizar a assimetria ascendente do equilíbrio de riscos, em meio a maiores projeções e riscos para a trajetória da inflação”, afirma o banco.
Mas a expectativa de subida das taxas de juro não é unânime. Para o C6 Bank, o início dos cortes nas taxas de juros pelo Fed nos Estados Unidos é um evento que traz mudanças no cenário global que devem influenciar a condução da política monetária em diversos países, inclusive no Brasil.
“Na nossa opinião, o dólar global deve continuar a enfraquecer e aliviar a pressão sobre o real. Mantemos a projeção de manutenção da Selic em 10,5% até o final de 2024”, diz o banco digital em sua análise, embora reconheça a possibilidade de o BC iniciar um breve ciclo de aumento dos juros nesta reunião, seguindo sinais recentes de diretores.
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