Após o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sinalizar a possibilidade de vetar o trecho que retoma a cobrança de impostos sobre compras de até US$ 50 em sites de comércio eletrônico do projeto de lei que cria o Programa Mobilidade Verde e Inovação, o Mover, o setor varejista apela para que a proposta não seja alterada e afirma que haverá prejuízos para a indústria e empregos no setor.
O presidente da Confederação Nacional do Comércio (CNC), José Roberto Tadros, diz que o veto seria um retrocesso “muito grande” para o varejo e prejudicaria o projeto de reindustrialização do Brasil.
“Não é um setor ou outro, esse dano é generalizado para o nosso país independente da classe social. Temos uma concorrência acirrada com os produtores asiáticos e os números mostram que isso cresce ano após ano”, afirma.
“Em um país que valoriza seu povo, essa é uma incoerência que vai prejudicar milhões de empregos no Brasil”, ressalta.
Para o CEO da PETZ e membro do Conselho do Instituto de Desenvolvimento do Varejo (IDV), Sérgio Zimerman, a isenção para o comércio eletrônico internacional representa “protecionismo ao contrário”. Segundo ele, trata-se de um subsídio do Estado brasileiro voltado para quem não cria empregos no Brasil.
“Para se ter uma ideia, a faixa de isenção de US$ 50 equivale a R$ 250, enquanto o ticket médio do varejo brasileiro é de R$ 180. Ou seja, a medida ameaça a morte do varejo brasileiro e, consequentemente, da indústria brasileira, que paga 90% dos impostos, enquanto os sites asiáticos pagam apenas 17% do ICMS”, afirma.
“São 18 milhões de empregos brasileiros em risco com essa medida”, destaca.
Zimerman ressalta ainda que, caso a proposta não seja aprovada, “não haverá outra alternativa para as empresas brasileiras que não seja começar a fabricar e vender fora do país” e se inscrever no Programa Embarque Conforme para pagar apenas os 17% de ICMS cobrados pelos Estados.
Embora Lula e a maioria da base governista na Câmara defendam a manutenção da isenção, o tema gera divergência até mesmo dentro do governo.
Na semana passada, durante sua participação na Comissão de Finanças e Tributação (CTF) da Câmara, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou que “é preciso haver um entendimento entre os três Poderes” sobre a situação.
Haddad destacou que o assunto é “delicado” e que deveria ter sido resolvido há cerca de seis anos, quando os auditores fiscais constataram o problema, mas por “determinação política” isso não aconteceu. Ele destacou ainda que a exigência dos varejistas e sindicatos nacionais é legítima.
O ministro disse ainda que não era uma diretriz do governo para que os parlamentares votassem contra o trecho, mas considerou que não é nesse projeto que as coisas serão decididas.
“Não é simples de resolver. A questão ainda está para ser decidida, nada está definido. Acredito que não será no Mover que isso será decidido”, disse aos jornalistas após a sessão.
No parecer do projeto Mover, o relator, deputado Átila Lira (PP-PI), justifica que o fim da isenção visa evitar “desequilíbrio” em relação à indústria nacional. Para o governo, porém, a tributação poderia levar a uma perda de popularidade.
Além disso, as alas governamentais acreditam que o retorno fiscal da medida não compensaria as repercussões negativas.
A proposta pode ter desfecho na Câmara dos Deputados ainda esta semana, já que a Medida Provisória (MP) que instituiu o programa perde validade na próxima sexta-feira (31). No Senado Federal, a expectativa é que o senador Omar Aziz (PSD-AM) seja o relator da proposta.
Especialistas avaliam
Leonardo Roesler, advogado tributarista e sócio do RMS Advogados, destaca que a isenção tributária para produtos de baixo valor, especialmente aqueles abaixo de US$ 50, tem sido explorada por comerciantes internacionais que muitas vezes subfaturam mercadorias para se beneficiarem.
Segundo ele, isso tem gerado uma concorrência desleal, prejudicando os produtores nacionais que não conseguem competir com os preços mais baixos dos produtos importados, e que muitas vezes têm qualidade inferior.
No entanto, o especialista considera que existem benefícios económicos e sociais a médio e longo prazo. Para ele, a receita adicional gerada por essa tributação pode ser utilizada para fortalecer setores estratégicos da economia nacional, incluindo investimentos em infraestrutura, tecnologia e inovação nas indústrias brasileiras.
“Além disso, ao nivelar as condições de concorrência, a medida promoverá um ambiente mais justo para as empresas nacionais, incentivando o crescimento e a sustentabilidade dos negócios locais. As empresas que hoje estão sufocadas pela concorrência desleal poderão reinvestir em suas operações, aumentar a produção e, consequentemente, gerar mais empregos”, afirma.
“Este ciclo virtuoso tem potencial para impulsionar o desenvolvimento económico e social do país”, conclui.
Gabriel Santana Vieira, advogado tributarista e sócio e proprietário da GSV Contabilidade, destaca que a proposta impactará diretamente os sites estrangeiros. Porém, segundo ele, ao mesmo tempo aumentará a receita tributária, além de proporcionar uma concorrência mais justa entre o comércio nacional e as plataformas estrangeiras.
O fiscalista considera ainda que os consumidores podem enfrentar preços mais elevados nas plataformas internacionais e, assim, reduzir o acesso a produtos mais baratos e diversificados.
“Não se pode negar que esta tributação beneficiará as empresas brasileiras ao reduzir a concorrência com produtos importados que muitas vezes têm preços mais baixos devido à atual isenção fiscal. Por outro lado, os consumidores podem enfrentar preços mais elevados quando compram em plataformas internacionais, reduzindo o acesso a produtos mais baratos e diversificados”, destaca.
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