A seca e o calor já levam municípios a adotar ou prever o racionamento de água no interior de São Paulo. Cidades importantes como Bauru e São José do Rio Preto enfrentam escassez de abastecimento de água. Em Bauru e outras cidades o rodízio já está em vigor. Rio Preto decidirá se adota a medida na terça-feira, 17.
Os incêndios agravam a situação, aumentando o consumo de água, usada para limpar a fuligem das casas e combater as chamas. Pelo menos 53 municípios do estado estão em situação de emergência por causa da seca e das queimadas, segundo a Defesa Civil estadual. Ao final de julho, eram dez cidades nessa condição.
Com a previsão de atraso no período de chuvas neste ano, as prefeituras estão realizando campanhas e aplicando multas pelo desperdício.
Na quarta-feira, 11, Atibaia declarou emergência hídrica e adotou rodízio devido ao risco de desabastecimento. A cidade foi dividida em três setores que recebem água em dias alternados.
Foram fixadas multas para quem lavar carros, calçadas ou regar jardins. Os moradores foram solicitados a relatar o desperdício. “A medida pretende mitigar os efeitos das secas para manter o sistema de abastecimento de água com o menor dano possível à população”, diz o decreto.
Em Rio Preto, os 501 mil habitantes correm risco de racionamento. De janeiro até o dia 12 choveu 47% menos que no mesmo período do ano passado. O município está sem chuvas significativas há 153 dias.
E em agosto, sob influência das queimadas, o consumo aumentou 3,09% em relação a julho. Na Barragem Municipal, onde é feita a coleta, o Lago 1 está 2 centímetros acima do vertedouro e o Lago 2 está 4 cm.
O sistema opera no seu limite. “Devido à gravidade da situação, o Semae – Serviço Municipal Autônomo de Água e Esgoto – teve que reduzir a captação de água da Barragem Municipal. O volume médio de coleta na barragem é de 450 l/s (litros por segundo). Neste momento, a ETA está captando menos da metade, 220 l/s. Esse é o limite de captação”, informa a prefeitura.
Para compensar, a captação do poço foi ampliada de 16 horas para 22 horas, também dentro do limite operacional. Segundo Semae, se não chover ou o consumo cair nos próximos dias, o racionamento será inevitável.
Na terça-feira, dia 17, o comitê se reúne para decidir sobre o racionamento. Segundo o superintendente do Semae, Nicanor Batista Jr., o município realiza campanhas de conscientização sobre economia de água.
A Secretaria de Águas de Bauru, que tem 380 mil habitantes, iniciou nesta segunda-feira, 9, uma série de manobras de rede para se adaptar à queda drástica do nível do reservatório do Rio Batalha. Na quarta-feira, o nível do rio atingiu um metro, mais de três vezes abaixo do nível ideal (3,20 m).
Vários bairros passaram a receber água de poços profundos para equilibrar a distribuição. O racionamento começou no dia 9 de maio e hoje os bairros têm água 24 horas e 48 horas sem.
Em Vinhedo, o rodízio também está em andamento desde maio. A multa para quem desperdiçar é de R$ 663, valor que dobra em caso de reincidência.
Moradores reclamam que recebem água suja quando o abastecimento é retomado, durante o rodízio. A Sanebavi, empresa de saneamento do município, afirma que a água retorna muito rapidamente e carrega resíduos que antes ficavam presos nas tubulações.
Lavar fuligem
O maior consumo de água para limpeza de fuligem de queimadas também prejudica o abastecimento, segundo a Companhia Estadual de Saneamento Básico (Sabesp). No final de agosto, a empresa alertou sobre o risco de falta de água em Franca e Restinga devido ao alto uso de água para esse fim.
Em Sorocaba, a prefeitura assinou decreto declarando emergência climática no município. A norma prevê multa de até R$ 150 mil para quem for flagrado colocando fogo na mata. Devido ao grande número de focos, o uso de água para abastecimento de caminhões-pipa do Corpo de Bombeiros e da Defesa Civil para combate a incêndios tem causado risco ao abastecimento urbano de água.
Os incêndios que se espalham pelo interior, além de aumentarem o consumo de água para limpeza de fuligem e combate às chamas, têm impacto direto no abastecimento de água. Em Marília, no domingo, dia 8, o incêndio atingiu transformadores e equipamentos da rede coletora Rio do Peixe, que abastece 50% da cidade. A suspeita é que um incêndio em terrenos vizinhos tenha afetado o local. Até a manhã desta quinta-feira, havia escassez pontual de água.
Cantareira em atenção
O Sistema Cantareira, que abastece grande parte da Grande São Paulo, tem 55% do seu volume útil total e opera na faixa de alerta, segundo o Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden). A faixa de alerta começa quando o sistema opera abaixo de 40%.
No final de agosto, o volume útil total era de 57%, enquanto no final de julho era de 62%. No início de setembro de 2023, a Cantareira operava com 73% do seu volume útil.
Desde maio, o Cantareira é abastecido com água da bacia do rio Paraíba do Sul, captada no reservatório Jaguari. Atualmente, são captados 7,5 metros cúbicos por segundo. Segundo o Cemaden, o sistema é classificado como tendo seca hidrológica variando de moderada a severa.
Além da Cantareira, a região metropolitana conta com outros seis sistemas de abastecimento, mas alguns estão em situação mais crítica. Rio Claro teve 26,9% do volume útil nesta quinta, enquanto o reservatório de Guarapiranga ficou com 40%. Em média, o volume total armazenado dos sistemas foi de 52,8%, mas com funcionamento negativo, ou seja, maior saída de água do que entrada.
O cenário também afeta bacias hidrográficas importantes para o abastecimento público. Nesta quinta-feira, o rio Piracicaba, que abastece Piracicaba e Americana, teve vazão 60% abaixo da média de setembro, segundo o Consórcio das Bacias Hidrográficas dos Rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí (PCJ). Na zona urbana de Piracicaba a situação é mais crítica, com vazão de apenas 18,3 mil litros por segundo, um terço da média histórica (55,3 mil litros).
O Serviço Municipal de Água e Esgoto (Semae) capta de 300 a 400 litros por segundo, mas a má qualidade da água provoca queda na oxigenação e dificulta o tratamento. Isso ocorre, diz a prefeitura, porque alguns municípios a montante de Piracicaba não tratam seu esgoto. Níveis baixos causam mortes de peixes. A cachoeira, atração turística, se transformou em riachos entre as pedras.
Em Porto Ferreira, o rio Mogi Guaçu, no ponto de coleta, está em 0,73 metros, quando o mínimo necessário para coleta é de meio metro. “Diante do cenário de atenção pelo nível do manancial e, principalmente, com as altas temperaturas que têm gerado aumento no consumo de água, a concessionária destaca que o uso racional do recurso pela população é um importante aliado para conseguir nos ajuda a passar por esse momento mais crítico da seca deste ano”, disse a concessionária BKR, responsável pelo abastecimento.
Sem racionamento
A Sabesp informou que o Sistema Integrado Metropolitano operou nesta quinta-feira, 12, com 52,8% do volume total e se mantém na média dos últimos cinco anos, que foi de 52%. “O sistema é composto por 7 fontes de água, o que permite abastecer diferentes áreas da metrópole com mais de um sistema, conforme a necessidade”, disse.
A empresa destacou os investimentos realizados desde a crise hídrica de 2014/15 para tornar o sistema mais robusto. “Não há racionamento neste momento nos 375 municípios operados pela Sabesp, mas, como mostram a forte seca e as altas temperaturas que atingem todo o país, a Empresa ressalta que o uso consciente da água é fundamental em qualquer momento”, disse. afirmou, em nota.
Chuva pode atrasar
Segundo o Cemaden, a previsão do tempo indica um provável atraso no início do próximo período chuvoso, o que resultará no prolongamento do período de estiagem nos rios de todas as regiões do país, com exceção da região Sul.
O provável atraso se deve ao maior aquecimento do Oceano Atlântico na região da América Central, favorecendo chuvas mais intensas do que o normal nesta região, resultando na redução das chuvas na maior parte da América do Sul, incluindo o Brasil. Como resultado, espera-se que a situação de seca persista ou até piore na maioria das bacias hidrográficas do país.
Ainda segundo o Cemaden, as causas da seca na região Sudeste, que inclui São Paulo, resultam de uma combinação de fatores como o déficit pluviométrico da temporada passada devido à ação mais intensa do fenômeno El Niño. Com isso, não houve recarga dos aqüíferos, mantendo os rios abaixo dos níveis esperados.
Houve também antecipação do período de seca no Estado, com poucas chuvas desde maio. Esta situação deixou o solo e a vegetação extremamente secos, criando um ambiente favorável à propagação de grandes incêndios.
O órgão vinculado ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações destaca situações que atuam no longo prazo, como as mudanças climáticas, que geram aquecimento progressivo da atmosfera, produzindo sequências mais longas de dias sem chuva, e mudanças no uso do solo, com o substituição de áreas florestais por campos dedicados à agricultura e pecuária, resultando na redução da umidade ambiente e, consequentemente, da precipitação.
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