Os pesquisadores têm a ajuda da inteligência artificial para identificar padrões de paralisia facial que possam indicar doenças neurodegenerativascomo a esclerose lateral amiotrófica (ELA).
A ELA causa fraqueza muscular que progride progressivamente, tendo como uma das consequências a paralisia motora irreversível, que também afeta os músculos da face.
Em estudar publicado na revista científica Digital Biomarkers, o brasileiro Guilherme Oliveira e seus colegas usaram a ferramenta para analisar vídeos de pessoas com ELA e indivíduos saudáveis realizando expressões faciais. Os movimentos eram simples, como sorrir, levantar uma sobrancelha ou apagar uma vela, mas conseguiram equipar o banco de dados de IA para identificar sinais sutis de paralisia facial.
“Não é algo para substituir os exames tradicionais, é para ajudar a identificar [a doença] e acompanhar o progresso, sempre auxiliado por um médico”, explica Oliveira, que iniciou o estudo durante o doutorado na Universidade Estadual Paulista (Unesp) e atualmente trabalha no Royal Melbourne Institute of Technology (RMIT), na Austrália.
Diagnóstico precoce
Atualmente, a ELA é diagnosticada por meio de uma série de exames e costuma se manifestar à medida que as pessoas envelhecem – portanto, é mais comum entre 55 e 75 anos, mas é uma condição rara.
Além dos músculos da face, a doença também atinge os responsáveis pela movimentação das pernas, braços, mastigação, deglutição e respiração e, por isso, tende a levar o paciente à morte.
Por se tratar de uma doença sem cura, o tratamento busca maximizar a função muscular do paciente para promover qualidade de vida. Assim, o registro periódico de imagens poderia auxiliar na percepção da evolução da ELA, pelo menos nos sintomas que acometem a face, o que poderia subsidiar ajustes no monitoramento.
A ferramenta também pode ser útil no diagnóstico precoce, importante para pacientes com ELA, segundo Diogo Haddad, neurologista do Hospital Alemão Oswaldo Cruz e presidente da Comissão de Inovação e Tecnologia da Academia Brasileira de Neurologia.
“É claro que a inteligência artificial nunca substituirá o médico, dada a complexidade do cérebro, mas certamente é um ponto importante para pensarmos em como avaliar esses pacientes mais cedo”, afirma.
Aplicação em outros casos
Oliveira ressalta que o estudo é um projeto piloto da ferramenta e que pesquisas envolvendo o uso de imagens e IA precisam ser testadas em uma população ampla, pois a ferramenta deve aprender as possíveis diferenças nas expressões faciais de pessoas de diferentes faixas etárias e etnias .
Até o momento, o método foi testado por 22 pessoas, metade delas com ELA e todas com perto de 60 anos.
Além de ampliar as análises relacionadas à esclerose, o grupo tem trabalhado na identificação de indícios de outros problemas de saúde. Os pesquisadores já testaram a ferramenta em casos de Acidente Vascular Cerebral (AVC), com sucesso na detecção dos danos que o problema pode causar nos movimentos faciais.
Nesse caso, a ideia dos cientistas é que a IA ajude socorristas e paramédicos no atendimento emergencial, como uma triagem da extensão do problema.
O grupo também analisa o uso da ferramenta em pacientes com doença de Parkinson, que também tem a paralisia muscular facial como um dos sintomas físicos. Assim como nos casos de ELA, o método de IA pode ajudar a monitorar o progresso da doença.
“A ideia é agregar. As doenças neurodegenerativas são multissintomáticas e este trabalho centra-se principalmente nos sinais de paralisia [da face]o que pode acontecer antes ou depois [de outros sintomas]”, destaca Oliveira.
O pesquisador espera, no futuro, expandir os testes para públicos mais amplos para que a capacidade de análise da inteligência artificial se torne mais precisa e identifique padrões específicos de diferentes doenças.
Para Haddad, de Oswaldo Cruz, o Brasil está crescendo muito na área de inovação e tecnologia, e o novo estudo reflete isso. Ele destaca ainda que a proposta da pesquisa está bem estabelecida e que encontrar padrões faciais para avaliar doenças neurológicas fará parte do processo diagnóstico em um futuro não tão distante.
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