A projeção populacional do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) indica que a população brasileira deverá atingir seu pico em 2041. A partir daí, a tendência é que diminua.
Este ponto de inflexão no crescimento populacional deverá chegar seis anos antes no país em relação à previsão anterior do instituto. Realizado em 2018, o último levantamento previa queda da população a partir de 2047.
O analista socioeconômico do IBGE, Jefferson Nascimento, explica que a pesquisa é feita considerando os intervalos entre a divulgação do censo demográfico.
“Com a inclusão do Censo 2022, percebemos que a população envelheceu muito mais rápido”, aponta o analista.
O último censo realizado pelo IBGE mostrou que o número de idosos aumentou 57,4%. O número total de pessoas com 65 anos ou mais saltou de 14 milhões em 2010 para 22,1 milhões em 2022.
O fato é que as pessoas estão tendo menos filhos no Brasil, e cada vez mais tarde, segundo dados divulgados pelo instituto nesta quinta-feira (22).
E esta questão da queda da fecundidade e do envelhecimento da população vem sempre acompanhada dos impactos que isso pode ter na economia de um país.
Especialistas consultados por CNN destacar duas questões: o mercado de trabalho e a aposentadoria.
Mercado de trabalho
“O principal impacto na economia é a diminuição da população na força de trabalho. Com esta diminuição, a capacidade da economia de alocar pessoas em alguns setores é afetada. Vai acabar faltando jovens em algumas áreas, então há um aspecto de mudança do perfil da população ocupada”, aponta Nascimento.
A lógica por detrás disto é simples: uma vez que nascem menos pessoas, a população em idade activa desta geração será menor.
Mas apesar de isso já ser uma realidade e um problema palpável em muitos países, o analista do IBGE ressalta que ainda não é hora de alarme no Brasil.
Nascimento explica que há dois elementos: ao mesmo tempo em que vive um processo de economias desenvolvidas, que é o envelhecimento populacional, o país ainda tem uma forte marca de economias em desenvolvimento: uma população ainda predominantemente jovem e um desemprego estrutural.
Portanto, indica que o impacto desse movimento não deverá ser sentido no curto e médio prazo, podendo ser observado mais próximo do ponto de inflexão.
“Por outro lado, pensando na demanda por trabalho, acabamos tendo oportunidades para a população jovem, pela escassez. O Brasil, portanto, ainda não estaria neste contexto [de crise]”, explica ele.
“Apesar do envelhecimento e da redução da população activa, ainda há desemprego estrutural, há espaço para a incorporação destas pessoas. No médio prazo não há impacto no mercado de trabalho.”
Kaizô Beltrão, professor da Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas da Fundação Getulio Vargas (FGV Ebape) e especialista na área de população e políticas públicas, indica que a partir do momento em que nascerem menos crianças, o impacto na força de trabalho seria chegariam 20 a 30 anos depois, pois é quando atingiriam a idade de trabalhar.
“Alguns países estão a implementar ou a tentar implementar programas para reverter o declínio da fertilidade. Mas a tecnologia também pode melhorar [o cenário] se essa mão de obra extra não é tão necessária para determinado setor”, aponta Beltrão.
Entre os setores que deverão ser mais afetados estão o comércio, habitação e serviços, por envolverem menos tecnologia.
“Quanto menos tecnologia, mais pode impactar a redução de pessoal na produção, de forma a reduzir a oferta desses serviços e também a demanda pelo consumo desses serviços quando temos menos população”, comenta Davi Lelis, sócio da Valor Investimentos.
E apesar de indicar isso como um potencial problema para o país, já que o Brasil não é uma grande vanguarda tecnológica, Lelis aponta a forte adaptabilidade do país a cenários de mudança.
“O Brasil tem que desenvolver mais tecnologia para poder compensar essa queda de pessoal, tanto na oferta quanto na demanda, e equilibrar o campo de atuação quando temos uma população estagnada ou em declínio”, avalia o sócio da Valor Investimentos.
Além da tecnologia com o declínio populacional, Nascimento indica a necessidade de todo o mercado ser revisto.
“A estrutura económica terá de absorver esta população mais idosa. Provavelmente, nos próximos anos, omO mercado de trabalho terá que se reconfigurar para acolher esses idosos”, finaliza o analista do IBGE.
O que muda
Além de uma maior automação, Roberto Nascimento, economista e professor do IBMEC RJ, aponta potencial aumento salarial no mercado.
“Com menos pessoas disponíveis para trabalhar, a tendência é que o mercado fique mais competitivo. Com menos gente, mais concorrência. E os empregadores, as empresas, terão que aumentar os salários, terão que aumentar os benefícios para atrair e reter talentos dentro da sua empresa”, aponta o economista.
“Por outro lado, é importante sublinhar que a escassez de mão-de-obra também pode levar ao abrandamento da produção e ao aumento dos custos de produção das empresas”, conclui.
O especialista em mercado de trabalho e CEO da Trilha Carreira Interativa, Bruno Martins, afirma que o ponto levantado por Jefferson Nascimento é a necessidade de as empresas estarem preparadas nos próximos anos para receber profissionais mais velhos.
“Por um lado, isso é bom porque eles têm capacidade de resolver problemas mais complexos, questões mais sensíveis e projetos mais robustos. Por outro lado, as organizações precisam continuar com planos de modernização estrutural que dependem dos talentos da geração Z, aqueles nascidos depois dos anos 90”, afirma.
“Nesse processo, a empresa terá que unir o trabalho das duas gerações para se manter competitiva no mercado.”
Ele reforça que esse movimento de adaptação ainda não foi percebido, enquanto a demanda por profissionais mais jovens e pela automação continua aumentando, definindo alguns desafios para a inclusão da população mais idosa no mercado.
“Além disso, podemos destacar que o preconceito de idade ainda é um desafio no mercado de trabalho em diversos setores. Profissionais com mais de 50 e 60 anos ainda têm dificuldade de recolocação no mercado de trabalho e, diante desse cenário [de envelhecimento]esta situação teria que ser revista no curto prazo”, conclui.
Pensão
Porém, para Roberto Nascimento, a projeção é preocupante pela redução do consumo de determinadas categorias e, principalmente, por questões previdenciárias.
“Com a redução da população economicamente ativa, temos uma contribuição menor para o INSS. E, no final, caberá aos cofres públicos cobrir um buraco ainda maior”, avalia o professor do IBMEC.
“Esse envelhecimento impacta diretamente a população, que ou terá que arcar com uma carga tributária maior para fazer frente a esse custo, ou terá que lidar com uma nova reforma previdenciária, com uma aposentadoria cada vez mais enxuta e com menos direitos.”
O economista destaca que já se fala em uma nova crise previdenciária e na possibilidade de novas reformas, dada a questão da indexação dos valores ao salário mínimo, o que alguns argumentam que levaria à insustentabilidade do sistema.
De uma forma ou de outra, Gean Duarte, especialista em finanças do Me Poupe!, ressalta que é hora dos brasileiros começarem a pensar em formas alternativas de se sustentar na aposentadoria.
“Cada vez mais sabemos que não podemos depender exclusivamente dos rendimentos das previdências públicas, do INSS. Como economista e educador financeiro, minha dica é que as pessoas comecem hoje a se preparar para que o futuro tenha dignidade quando decidirem ou precisarem parar de trabalhar e se aposentar”, finaliza.
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