A boa gestão das questões fiscais é um dos pilares essenciais para o progresso, independente do governo. Equilibrar as contas públicas para fazer face às despesas obrigatórias e incluir novas despesas no Orçamento exige uma organização que, hoje, não é adequada.
A avaliação é do professor associado da Fundação Dom Cabral, Paulo Paiva. Foi também Ministro do Trabalho e do Planejamento e Orçamento no governo de Fernando Henrique Cardoso.
Paiva apresenta uma projeção preocupante para o futuro da economia no Brasil: um colapso fiscal. O conceito refere-se à situação em que toda a receita tributária do país estará totalmente comprometida com despesas obrigatórias.
Como resultado, será impossível garantir espaço para gastos discricionários e, consequentemente, o Executivo perderá a flexibilidade e a capacidade de gerir o Orçamento.
Para contextualizar o conceito apresentado, o professor destaca que “em 2010, tivemos um compromisso de receita com despesas obrigatórias totalizando 86%. 13 anos depois, esse percentual chega agora a 92%.”
A questão é que, segundo ele, se a situação continuar na mesma velocidade, em 2040 a receita total será comprometida com as despesas existentes.
Seguro Social
Num panorama do conjunto de despesas, Paiva destaca que os benefícios da Previdência Social são os que mais crescem.
Para ele, a administração da Segurança Social deve observar um ponto crucial para o futuro do Orçamento: a transição demográfica.
Paiva considera que o sistema atual, em que os trabalhadores contribuem para o pagamento do benefício da segurança social, é sustentável durante o período em que o número de cidadãos que ingressam no mercado de trabalho é superior ao número de pessoas que passam a receber o benefício.
As projeções indicam, no entanto, que a transição demográfica conduzirá a uma diminuição do número de contribuintes. Com isso, destaca o ex-ministro, as despesas deverão crescer mais rapidamente que as receitas.
“Esse casamento entre receitas e despesas nos leva a projetar que o sistema previdenciário no Brasil é insustentável. Uma nova reforma deverá ser realizada em um futuro próximo. Quanto antes melhor”, afirma.
Ainda sobre a Previdência Social, Paiva destaca outro problema, desta vez, na legislação brasileira.
“Os benefícios previdenciários são reajustados anualmente com base no salário mínimo. Isto cria uma grande pressão para evitar um aumento maior do salário mínimo. Por outro lado, deverá ter uma trajetória de crescimento que incorpore os ganhos de produtividade dos trabalhadores.”
Ele considera que, como o benefício incorpora os ganhos do aumento da produtividade, esse aumento é transferido para quem não contribuiu, ou seja, os aposentados.
Com isso, o professor avalia que seria justo que benefícios, como a Previdência Social, fossem corrigidos pelo índice de inflação, e não pelo salário mínimo.
Emendas e legislação
Apesar da relevância da reforma previdenciária, ela não é a única necessária na reorganização do Orçamento do Brasil, ressalta Paiva.
“O aumento extraordinário de emendas parlamentares é um indício da redução da capacidade do Executivo de gerir o país e, especificamente, da gestão do Orçamento”, analisa.
Ele ressalta ainda que a questão fiscal é apartidária. “Ninguém governará o Brasil se esta trajetória de crise fiscal anunciada não for resolvida.”
No plano legislativo, uma decisão instituída em 1964 também se destaca na discussão do possível colapso fiscal.
A Lei 4.320 estabelece normas gerais de direito financeiro para elaboração e controle de orçamentos e balanços da União, dos estados, dos municípios e do Distrito Federal.
Apesar de inovador para a época, segundo Paiva, precisa ser atualizado. Esta estrutura institucional das finanças públicas define como a sociedade gostaria que as contribuições para o governo fossem geridas. De forma eficiente, do ponto de vista da sua alocação, e tendo em vista o bem-estar coletivo.
“Há um aporte financeiro independente no Senado que acompanhou a revisão. Há instituições que estão acompanhando e especialistas muito competentes que estão trabalhando nessas questões. Acho que seria importante avançar e convidar a sociedade para discutir esses temas”, finaliza.
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