A Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (ApexBrasil) concluiu que o general da reserva Mauro Lourena Cid utilizou o escritório de Miami para negociar joias do acervo da Presidência da República.
A CNN contatou a equipe de defesa do general sobre as conclusões da agência, mas não recebeu resposta até o momento da publicação do relatório.
Os resultados da investigação interna da Apex, iniciada em abril do ano passado, foram obtidos por CNN.
Lourena Cid, pai do ex-ajudante Mauro Cid, chefiou o escritório da Apex em Miami entre 2019 e 2022, durante a gestão de Jair Bolsonaro (PL).
A Apex afirma que a foto em que o general aparece no reflexo de uma escultura de palmeira foi tirada dentro do escritório de Miami e com um celular corporativo.
A obra de arte, segundo investigações da PF, era comercializada nos Estados Unidos, mas não houve venda, pois a peça não continha todos os componentes de ouro.
“Com base no relatório da Polícia Federal, foi possível concluir que, às 10h39 do dia 4 de janeiro de 2023, já demitido, mas ainda nas dependências do escritório da Apex, utilizou seu celular funcional para compartilhar fotos das joias e objetos de arte do acervo atribuído ao ex-presidente”, diz Apex.
A foto foi enviada em janeiro de 2023, data posterior à saída do general da Apex, em dezembro de 2022.
Relatos ao comitê da agência também indicam que Lourena Cid resistiu em devolver seu notebook e celular corporativos, mesmo após deixar seu cargo na Apex, em Miami. Os equipamentos foram devolvidos nos dias 17 de janeiro e 7 de fevereiro, respectivamente.
“Quando o celular foi devolvido, seus dados foram apagados, de forma irregular, por um servidor da EA [Escritório Apex] Miami na presença de outras pessoas. (..) Em ambos os casos, foi descumprido o procedimento padrão de devolução e apagamento de dados de equipamentos ApexBrasil, que devem ter sua integridade atestada e seus dados apagados por prestador de serviços de tecnologia contratado pela Agência. Seu passaporte oficial com visto de trabalho vinculado à ApexBrasil nunca foi devolvido”, diz a investigação interna.
O órgão concluiu ainda que a presença de Lourena Cid no escritório, após o seu afastamento do cargo, “contou com algum tipo de apoio ou omissão dos colaboradores”.
A presença do general no gabinete com o ex-ajudante Mauro Cid, um de seus filhos e a esposa, Gabriela Cid, em janeiro de 2023, também foi denunciada à comissão.
Em agosto de 2022, o general também recebeu o corretor Cristiano Piquet nas instalações da Apex.
Nas investigações da PF, Piquet aparece como responsável pelo transporte da mala com a escultura da palmeira a pedido do ex-ajudante de campo Mauro Cid.
“Declarações também revelaram a frequência de pessoas não relacionadas aos negócios da ApexBrasil no escritório da GM [general manager, cargo de Lourena Cid]sem registro no diário”.
Visita ao acampamento golpista
Além do uso indevido do cargo, a reportagem diz ainda que Lourena Cid com outros dois funcionários “violaram as normas do órgão” ao visitarem o acampamento golpista, no Quartel-General do Exército, em Brasília, em dezembro de 2022. As viagens foram pagas com fundos da Apex.
A comissão informa ainda que Lourena Cid “expressou repetidas vezes aos funcionários sua convicção de que, mesmo após ser eleito, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva não tomaria posse e que ele, Cid, continuaria no cargo”.
Desvios de função
Para a Apex, Lourena Cid teve “comportamento desviante” em relação às funções que lhe foram atribuídas. O relatório descreve que funcionários próximos do general prestavam serviços pessoais “inclusive na residência de Lourena Cid na cidade, num claro desvio de função”.
O documento informa ainda que a direção “se afastou das atividades empresariais” que pertencem ao órgão e dizem que o general não fez propostas nem atraiu investimentos para o país.
Segundo a comissão, entre os agravantes do comando de Lourena Cid na Apex-Miami está o status de “anexo consular” conferido ao escritório.
Com este título, os diretores do escritório obtêm benefícios e imunidades concedidos aos diplomatas.
Conclusão
O relatório da Apex será enviado ao Supremo Tribunal Federal (STF), ao Tribunal de Contas da União (TCU) e à Polícia Federal (PF) para análise de possíveis crimes.
Segundo a Apex, “novas medidas poderão ser tomadas após a continuidade do processo de investigação e responsabilização, incluindo a demissão de funcionários”.
A diretoria da agência também intervém em Miami para “avaliar todos os aspectos de sua funcionalidade operacional e comercial e propor uma reestruturação completa. Este trabalho está quase concluído.”
Quanto à situação do anexo de consulta, a administração solicitou ao Ministério das Relações Exteriores que revisse esta condição do escritório de Miami.
A comissão afirmou ter realizado “16 audiências individuais e o exame de extensa documentação” desde 2 de abril.
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